Sei que ninguém liga ao que eu digo. Eu escrevi 'ao que eu digo', note-se. Não adianta virem desmentir: 'vê lá e tal que não é bem assim, olha para o lado e verás que te rodeam pessoas que te amam e te admiram, pessoas que falam contigo, que te acarinham e te querem um bem incomensurável'.
Eu sei que as pessoas não ligam ao que eu digo. E pronto, eu é que sei.
É por isso que posso muito bem ir na rua, ouvir alguém arrotar alto e eu responder 'mete óleo, querido'.
É por isso que eu posso dizer a algum motorista foribundo por eu o ter feito parar na passadeira: 'aguenta aí os cavais, filho dum cabrão'. (sim... aqui eu sei que dificilmente me ouviriam de dentro de um carro com o motor ligado, mas sabe-se, creio, que muitas vezes uma expressão de rosto revela bastante, certo?)
É por isso que eu posso dizer ao caixa de supermercado que me pergunta gentilmente se quero um saco para pôr os congelados: 'quero sim, obrigada, são melhores para pôr o lixo'.
É por isso que posso ouvir uma mãe irritada dizer a um filho pequeno: ' tu queres levar?' eu dizer sem que a conversa seja comigo: ' hum, não me parece...'
Não ouvem, não. Não ouvem nada.
E há mais, muito mais, eu agora é que não me lembro.
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