segunda-feira, 18 de julho de 2011

A muita idade

Não quero que a minha mãe envelheça. A minha mãe não quer que a filha dela envelheça. Ela tem de ficar sólida no seu posto para me amparar, eu tenho de ficar sólida no meu para apoiá-la. Os nosso desejos chocam-se frontalmente, carneiros obstinados, quase imobilizados pela violência do choque.
Podemos chegar a extremos absurdos.
É muito simples: censuro à minha mãe ter-me dado a vida sem me ter dado também todos os dons, ter sido simultaneamente a minha boa fada e a minha fada má. Tal como à primeira alegria corro para ela antes de para mais alguém, é também para ela que corro, cheia de cólera, a cada derrota. Nãolhe perdoa por não me ter feito perfeita e imortal. Agora que a velhice me ronda, ela não suporta as minha imperfeições e a minha mortalidade.
Não tive estas exigências em relação ao meu pai. Ele estava de fora. (...)

«Tu ainda és nova!», diz ela a cada instante. Não é verdade, sou mais velha do que ela, pois tenho ainda de manter um emprego e tenho de carregar nos ombros uma velha mãe.
No espelho refletimo-nos uma e outra, indefinidamente, e nas profundezas da imagem ressoam os nossos pedidos de socorro.
(páginas 150, 151)

In 'Frases curtas, minha querida' de Pierrette Fleutiaux

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