quinta-feira, 5 de março de 2009

Lisboa antiga


Era já fora de horas de expediente, quando um dia fui com o Luís para montar duas fechaduras na casa duma cliente ali para os lados dos Caminhos de Ferro, em Lisboa.
Chegados à porta da senhora, deparei-me com um prédio antiquíssimo e em muito mau estado. Depois de entrar reparei que nas paredes era visível a estrutura metálica, que o Luís disse chamar-se estrutura de gaiola e que era vulgarmente usada há séculos atrás. Ao que parece, o prédio conta com uns duzentos anos.
Enquanto ele trabalhava ali no piso térreo na fechadura da caixa do correio, íamos conversando, nós e a senhora.
No que restava das paredes vi desenhos lindíssimos, pintados à mão por algum mariola de boina à pintor francês apoiada no cocuruto e a paleta das cores numa das mãos, ou então algum trolha sensível às artes plásticas, ou ainda, alguém simplesmente jeitoso com o pincel e as tintas, quiçá? Não saberei a menos que faça uma pesquisa.
Pela conversa percebi que aquele prédio estava em risco de ruir por completo e que a senhora era a única inquilina do prédio.
O Luís acabou o primeiro trabalho e subimos ao terceiro andar a fim de executar o que restava. As escadas possuíam as piores qualidades - a iluminação era abaixo do mínimo aceitável e eram íngremes, estreitas, altas e podres.
E a conversa continuou desenrolando-se sobre vários factores relacionados com a conjuntura actual do nosso país. Já ia dando para perceber melhor... a senhora mantinha um negócio ali, ah!...
Durante a execução dos trabalhos, em todos os lugares onde já tínhamos estado até ali, foi sempre na penumbra. Ali, apesar da obscuridade, os meus olhos focaram uma pequena placa onde figurava um preçário toscamente manuscrito:

Quarto - 5 euros a noite

Ah!... Aquilo era uma pensão. Ah!...
O trabalho foi concluído e experimentado pela cliente e chegara a hora de pagar. A soma da conta perfazia o montante de algumas dezenas de euros. A senhora foi lá dentro buscar o dinheiro. Esperámos. Nada de cheques ou dinheiro de plástico, regressou com o dinheiro na mão, era numerário mesmo. Ia depositando o dinheiro na mão do Luís enquanto o conferia. A senhora pagou a totalidade da sua conta em notas de cinco euros... lisinhas, lisinhas, lisinhas.
A minha conclusão é a seguinte: os quartos são baratinhos devido ao mau estado das instalações. Os clientes da senhora pagam em notas de cinco euros. Ela, com medo dos furtos, enfia-as debaixo do colchão. E, por último, é por isso que o pagamento surgiu feito em notas de cinco lisinhas, lisinhas, lisinhas...

2 comentários:

Anónimo disse...

Uma pensão! Por esse preço, se calhar foste simpática na definição, ;)

Gina G disse...

Fui... porque é claro que aquilo é umapensão usada para isso mesmo...