domingo, 6 de abril de 2008

O Primo

Tive amigos cá em casa a almoçar. Os amigos são recentes e quando lhes foi perguntado se quereriam ver os álbuns de fotografias do meu casamento demonstraram interesse. Achei curioso porque normalmente fotografias deste tipo só interessam a quem aparece nelas ou a quem esteja ligado por laços familiares.
Ao folhear os álbuns relembrei e contei várias histórias de familiares. E também lembrei pessoas que já morreram, as que já tinham morrido naquela data e as que já morreram depois disso. Infelizmente já são várias...
Depois disso, inevitavelmente, fiquei nostálgica. Lembrei-me do meu primo que morreu quando eu tinha 15 anos e ele 18. A morte dele custou-me muito, era o meu primo preferido, tinha-lhe uma amizade tão grande e tão profunda que mais parecia paixão, embora eu não sentisse absolutamente nada de físico em relação a ele, era um amor platónico.
O António era um excelente rapaz, muito meigo e calmo. Tinha montes de paciência para mim e para as minhas infantilidades. Conversávamos imenso sobre tudo e mais alguma coisa, nunca me dizia que não lhe apetecia brincar ou falar comigo. Eu ficava deliciada com a atenção que ele me dedicava, era muito diferente do meu irmão que não tinha grande paciência para mim...
Não nos víamos muito porque morávamos distantes. Porém, a última vez que o vi tive uma espécie de pressentimento de que não o veria mais. Quando me despedi dele pensei algo que hoje sei que foi assim:" É a última vez que eu te estou a ver." Talvez eu tenha tido aquele pensamento (que na altura não foi claro, só ficou claro na minha cabeça assim que soube da sua morte, pois foi esse o primeiro pensamento que tive) por a nossa amizade ser tão forte e tão especial.
Não quero escrever um post místico e que incida no sobrenatural, de maneira nenhuma. Mas a verdade é que eu acredito que há algo de transcendente porque o ser humano não é só corpo, é também espírito. E aquilo que eu pensei naquele dia pode chamar-se de percepção extra sensorial. Isto é algo em que acredito porque já senti pelo menos uma vez - esta vez.
O meu primo era filho único, os meus tios eram emigrantes e tinham-se fixado em Portugal alguns anos antes do trágico acidente que causou a morte dele. Durante uns tempos, julgo que anos, o seu quarto foi mantido como ele o tinha deixado, as roupas nas gavetas, os objectos pessoais nas prateleiras e inclusive, o disco que ele ouviu pela última vez em cima do prato do gira-discos, tratava-se de um grande êxito daquele tempo "The eye of the tiger" dos Survivor. (Agosto/1983)
Nas visitas que seguidamente fizemos aos meus tios, esperava uma altura em que ninguém reparava e escapulia-me até ao quarto dele. Eu tinha só 15 anos mas não tinha medo nem me fazia impressão nenhuma entrar no quarto dele, era a maneira que eu tinha de matar saudades. Ficava lá uns minutos a olhar para o seu pequeno mundo, o mundo que o António cá deixou. Estranhamente aqueles minutos faziam-me bem, era uma maneira de estar com ele.
Os anos passaram...
... e hoje eu lembrei-me do meu primo. Acho que foi um tempo bem empregue o que passei a escrever sobre ele, ainda que tenha ficado muito por escrever...

4 comentários:

redonda disse...

Gosto de ouvir (ou ler) pessoas que acreditam porque quero acreditar.

Gina G disse...

Podia dizer-te que basta acreditar mas obviamente não é bem assim. Mas se queres acreditar já é meio caminho andado.
:-)

Anónimo disse...

Eu tambem acredito que que quando morremos nao acabamos definitivamente. Bem espero que sim , pois acho que temos que continuar a nossa missao.

nao te esquecas da receita de bolacha, andou com desejo de fazer a tua sobremesa....
bjs
perdidosemafrica

Gina G disse...

Olá Cris!
A minh amissão às vezes dá-me que pensar...
Assim que possa publico a receita, ok?
Beijinhos