Queria escrever da casquinha d' ovo que vinha a voar e embateu... Não, é forte demais, uma casquinha d' ovo não embate, quando muito pousa.
Queria escrever da casquinha d' ovo que pousou no lábio da mulher que esperava o sinal da avenida pôr-se verde.
Queria escrever da casquinha d' ovo, rebelde... Rebelde, não, que a casquinha é bem-mandada, move-se ao sabor do vento. Rebolante, ondulante. Rebolante e ondulante, sim.
Não quero escrever do vento nem da extensão da avenida, que é longa. Não quero escrever da torre lá no cimo, que o vento contorna e faz remoinho até achar uma brecha... Achar uma brecha, não, encontrar-se com a ventania que já vem da rotunda a dois quilómetros do sinal, onde estamos, a mulher e eu. E vêm velozes, o vento e a ventania, avenida abaixo, transportando toda a classe de porcarias.
Não quero escrever e escrevo. Não quero escrever e escrevi.
A senhora fez um gesto brusco e levou o dedo indicador à boca retirando uma partícula branca e colante. Com grande horror verificou que era um pedacinho de casca de ovo. Riu. Entre o asco e o espanto. Parecia um riso de opereta. Teatral. Uma cena cómico-dramática.
1 comentário:
Mas aconteceu e passa a ser mais um caso da vida.
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