sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Traição


Atravessei o pátio do costume. O homem, que já antes eu vira entrar com uns tubos de galvanizado na mão, tinha-os envolto em papel de jornal e ateara-lhes fogo. Espantada, parei um pouco a observá-lo.
- Então, está com frio? - perguntei eu.
- Não - disse ele - o fogo é para os desenroscar. Preciso deles!
Encolheu os ombros como se aquele fosse o único remédio ao dispor. Mentalmente abanei a cabeça em jeito de desaprovação. Afinal de contas, aquele é um material obsoleto e sempre há lojas onde se pode comprar aquilo de que se precisa. Sim, eu sei: reciclar é viver. Mas a malta que sobrevive do que uma loja rende, até precisa de vender e tal...
Retomei a marcha e fiz o que tinha a fazer. À vinda para cá diz-me ele:
- Todo o ser vivente é traiçoeiro!
Aproximei-me para o entender bem - queria escrever aquilo. Ante o meu ar inquiridor e súbito interesse ele hesitou um pouco, embaraçado. Repetiu a frase e depois acrescentou:
- O gato põe-se à coca do rato para o caçar à traição. E eu, também foi à traição que consegui desenroscar os tubos. Pensei «ai não queres? então 'pera aí que eu já te conto como é!» Fui traiçoeiro e consegui!

E já está! Houve alguém que deixou de vender tubo PVC a alguém que achou no lixo o tubo galvanizado de que precisava...
Não obstante, este senhor tem a sua piada. Eu cá acho.

2 comentários:

inespimentel disse...

Donde venho tudo se comprava, novinho, à medida!
A minh escolha é o aproveitamento minucioso, consciencioso, quase avarento, também criativo, de TUDO o que consumo! Sem excepção... por opção!

Gina G disse...

Se o aproveitamento for consciencioso, eu apoio.
Mas, como eu lido directamente com o 'poupar' e o 'reciclar', sei que na maioria das vezes lá se vai a consciência, a poupança e a reciclagem...