sábado, 31 de março de 2012

31

Hoje é dia 31. Algo raro, já que só ocorrem 7 dias destes em cada ano.
Em dias especiais fazem-se coisas especiais.

...

Hum...

sexta-feira, 30 de março de 2012

Regresso sem pompa

(Este post pretende ser uma espécie de diário para memória futura, pois sou sobretudo uma memorialista, e não é, de maneira nenhuma, uma queixa.)

Lisboa, 30 de março de 2012

«Vamos a isto... Escrever dói. Escrever possui dolo. Porém, é um ato irresistível, ao qual sucumbo sem dar grande luta.»

Passaram oito dias desde a última publicação. Regresso hoje, conforme se verifica. Fiz um interregno algo forçado, e devo dizer que há vários dias que sinto vontade de publicar os textos que entretanto escrevi. Quem lê o blogue com regularidade sabe que os meus intervalos não têm o intuito de descansar da escrita mas somente afastar-me da exposição.
Tenho andado um tanto ou quanto confusa relativamente ao que hei-de fazer com o blogue: abandoná-lo radicalmente ou continuá-lo incessantemente?
Escrever e dar a 'cara' à blogosfera, apresentar pequenos episódios, expor ideias e opiniões nem sempre é maravilhoso, por vezes tem uma fasquia desprezível, ínfima mas ludibriosa, que deita por terra todo o bem que rodeia a escrita. Ademais, no meu caso, as partilhas são pouco correspondidas e há alturas em que a solidão advinda me afeta bastante. Por outro lado, bem sei que a mesmíssima solidão me é necessária, pois não publicaria as minhas histórias se andasse muita gente a pisar 'este chão'. Outra contradição é a de me apaixonar tão facilmente por pessoas e situações quanto me aborrecer com as mesmas. Deixei de contrariar e tentar compreender estas questões, percebi que é debalde, mas sou incapaz de não me deixar afetar em alguns momentos, talvez mais vulneráveis. Este impasse, este não saber, este bambolear entre dois opostos é terrível e baralha-me de sobremaneira. Porém, por razões que não me convém explanar, o regresso é mister. Voltei.

Tenho uma amiga...

Tenho uma amiga que gosta de bolos redondos e pede ao homem da cafetaria que lhe avie um desses gordos.
Esta amiga agarrou no bolo e sentou-se confortavelmente, encostou as costas à cadeira, esticou o peito e estendeu as pernas. Eu bem vi.
Trincou, mastigou, saboreou. Deleitosamente. Com a boca toda, usando todos os sentidos, como estes se querem usados. Não tirava os olhos do homem da cafetaria que, absorto pelo trabalho, limpava os talheres. Eu bem vi.
Mantinha o corpo quieto e estendido achando que essa quietude lhe dava uma graça felina, mantinha o olhar no homem distraído como se ele fosse interessante para observar. Mantenças intuitivas, transformá-la-iam numa figura sensual, seguramente. Eu bem vi.
Num pequeno descuido um pinhão dos que cobria o bolo rolou por ali abaixo aterrando na curva do interior das coxas juntas. Agarrou no pinhão e meteu-o na boca, fitando o vácuo imaterial, cheia de mistério sedutor. Eu bem vi.
E o homem retirando bolhinhas d' água dos talheres com um paninho maculado e húmido, a cara séria, o pensamento ausente. Ela trincando o pinhão prazerosamente com os dentes da frente. Ele retirando os talheres molhados dum tabuleiro, passando o pano com minúcia, colocando os talheres secos noutro tabuleiro, como quando a gente automatiza um pequeno e incontornável gesto e lhe suga um prazer imaginário, antes que a vida desmorone e tenhamos de fugir. Eu bem vi, que eu bem via o homem, também ele.
Nisto, outro pinhão rola, aterrando na união das coxas unidas, por modo a coar pinhões rolantes, quiçá. Mas desta feita o fruto minúsculo estacou ligeiramente mais acima. Hum, que casualidade fantástica. Eu bem vi.

Lâmpadas

Escreveria um preâmbulo acerca da vida atual das lâmpadas e derivados mas não vou escrever. Pois é. Daria um trabalho descumunal e tal movimento literário seria infrutífero, uma vez que ao momento não tenho a criatividade no auge.

Maquiavélica (vou chamar-lhe este nome pomposo e cheio de graça porque um dia me enganei em cinco cêntimos e caiu-me a drogaria em peso no alto da cabeça) queria lâmpadas. Seis. Maquiavélica hoje riu, para meu gáudio. Riu contrapondo a seriedade, mas riu. Mostrou os dentes amarelos sem resquícios de batom, que a área labial estava bem colorida e fixada, com produtos de qualidade elevada. Tem um carrapito ridículo no alto da cabeça, ao qual a minha mãe chamaria 'cagalhão', caso a visse. Mas deixo as particularidades graciosas da minha mãe para textos vindouros.
Pus a Maquiavélica bem-disposta, é o que é. Eu ou as minhas frases simples, pouco importa. Primariamente falei de filamentos e casquilhos roscados e27 com muita propriedade, posteriormente o retângulo antiquíssimo, com dois orifícios similares em tudo menos no diâmetro, onde se testam as lâmpadas não estava a funcionar e por isso todas me estavam a parecer fundidas. E não estava a funcionar porquê? Porque eram horas de almoço e eu já havia desligado a luz... Que quando a madame se fez chegada eu estava de abalada, molho de chaves tilintando, mala na mão. A postos para a pausa restauradora, pois é.
Maquiavélica riu, o que merece atenção e um texto alongado no blogue. Foi um riso posterior à minha graça e aos meus conhecimentos, não um riso escarninho devido ao esquecimento, não, antes um riso cúmplice, afinal a bicha tinha chegado àquela hora e eu não a havia mandado embora, era melhor dar-me um descontozinho de pessoa cheia de rigores mas condescendente. Então, riu. Acrescento, ainda, que ali pelo meio o riso me pareceu amoroso, tendo em conta o encontro anterior com esta distinta senhora...

Casaquinho obediente

Não é tão gracioso um casaquinho de malha leve repousar muito quieto em cima do peito do manequim daquela loja ali? Uma fileira de botões verdes em cima da mama esquerda, outra fileira de casas verdes em cima da mama direita... Topezinho por baixo exibindo pregas amarelas perpendiculares às fileiras verdes... Pormenores coloridos mas imóveis, meros objetos sem vontade, não há brisa que desfaça a pose, é só um manequim dentro duma montra. Ai se fosse na rua, como esvoaçariam todos estes pedacinhos de roupa...

É melhor parar por aqui, há cavalheiros que deitam o olho ao blogue, ainda me vão julgar sensual, e disso não sei nada. Dum modo geral os homens temem as mulheres destemidas, em particular as que escrevem despudoradamente. (Tenho a mania que sou uma dessas.)


«Estás a ler ou a fantasiar? As confabulações de um grafómano exercem assim tantas sugestões sobre ti?»

'Se numa noite de inverno um viajante', Italo Calvino
páginas 119, 120

Sobejamente interessante

Considerar os homens mais interessantes que as mulheres pode estar ligado à sexualidade. O leitor querendo que assim seja, faça favor de assentar a ideia, que eu cá não confirmo nem desminto, não me apetece escrever mais por agora.

A cara

Aquela rapariga tem boca de cavalo (?!). Os dentes são brancos, grandes, justos e os maxilares formam um arco muito pronunciado.
Imaginando (a bendita imaginação propaga-se a alta velocidade, ao momento) que eu era uma escritora consagradíssima e empolgada em arranjar artimanhas literárias para me entenderem (escreveria o termo técnico para isto mas os conhecimentos na área são acanhados) teria nesta semelhança uma grande vitória.

«A rapariga de boca de cavalo...» E blás, a escritora que invente o resto.

Mas como sou (volto à realidade, agora) uma mera escrevente de textos duma qualidade que não interessa especificar (não interessa, pois não?!) por aqui me fico.

A inocência de alguns adultos

O fulcro pode ser apenas sugestionado, às vezes escrevo assim. Gosto particularmente da inocência que algumas pessoas revelam ao depois de ler o blogue. O que para mim é fulcral, aos inocentes leitores passa completamente despercebido.

A maluqueira

Ter-me despido num centro comercial não tem nada de especial, quando muito poderá ser um ato fogoso, está calor. Mas eu queria que fosse indício de que sou uma ganda maluca. Mas uma ganda maluca daquelas cheias de piada com toda a gente a querer imitar.

Dizer a um vendedor que da última vez estivemos os dois entretidos a manhã inteira também não é obrigatoriamente um caso engraçado. Mas eu gostava muito.

Remédio gratuito para os nervos de qualquer um

Eufélia vai ao senhor doutor. Não que a falta de magnésio não esteja suprida, para já essa parte do corpinho franzino normalizou. É que sente-se enervada, combalida, triste.
Expostas as queixas, o senhor doutor foi direto no receituário:

'A dona Eufélia saia de casa, entre numa uma loja qualquer, peça o que vir nas prateleiras, finja que escolhe alguma coisa e depois diga que afinal não quer. Não fique assim, distraia-se!'

Dá-me a ideia que fui alvo deste receituário algumas centenas de vezes, o senhor doutor até tem o seu consultório aqui ao pé e tudo...

O olhar

Para que é que estás a olhar?

Para me distrair.


Se for para quem, é para ti. Distrai-te tu também, vá. Não tem graça nenhuma observar alguém atento à minha presença.

A visão consequente
Ou
Solidão malfadada


Tem calma. É só uma miúda de gelado na mão.
Habitasse alguém contigo e saberia do que falas e teria as mesmas visões.

2 coisas

Há seguramente 2 coisas
pelas quais fazemos N coisas:
porque somos obrigados;
porque sim.

Conversas da outra gente

Gosto de conversar mas sou muito irregular no ato em si. Preciso que alguém se chegue à frente, não 'converso' sozinha, não possuo tal dom. Há pessoas que conseguem e a essas admiro-as de verdade. Tenho o hábito intrínseco de admirar nos outros as capacidades que não consigo desenvolver.

De valor

As pessoas não têm de valer pela parte física mas é o que se avalia primordialmente. Após a avaliação, os dias decorrendo sucessivamente, o desassossego retornado, o desinteresse instalado, haverá algo a dizer acerca do vesgo ou da gorda. Invariavelmente.

Conselho

'Então, dona? Está triste? Não esteja assim, vá... Isso, beba o cafezinho, beba que faz bem.'

Pés, ou isso

Carminho não é fadista. Que fique bem assente. Carminho embeleza as extremidades dos membros inferiores dos clientes, dentre outros servicinhos de estética, claro está.
Um dia, estávamos as duas muito soturnas, uma calada; outra muda. Ela decide romper o silêncio mortuário:
– Então hoje não vê as receitas na revista?
– Não, hoje não me apetece – respondo, vaga – Estou um bocado ausente...
Mal sabe ela que a observava e por isso desprezava a revista. Carminho é dona duma graça natural algo invulgar, sabe que a tem mas não sabe que eu sei. O que eu queria era escrever essa graça, desenhá-la com as minhas palavras, só que não consegui.

Indo eu, indo eu
em caminhos de Lisboa


Ele foi explícito:
– Vais à avenida de Madrid comprar quarenta peças do modelo tal.
Ela deslocou-se à avenida do México. Por falarem o mesmo idioma seria como ir à mesma avenida, quiçá. Mas não. Engano redondo... Percorreu um círculo pelas ruas e praças de Lisboa.

5

Passaram cinco anos.
Cortou o cabelo num penteado novo e moderno: franja grossa, as mechas caindo logo acima das sobrancelhas, como fasquias aparentemente rebeldes.

Passaram cinco anos.
Deslocou-se à casa ferrosa para almoçar e conviver com os amigos. No caminho, florinhas resplandecentes, ervas verdejantes e passarinhos cantantes prestavam-lhe vassalagem.

Passaram cinco anos.
Tirou fotografias a todos os amigos, ávida da sua presença. Uns riam com prazer, outros conversavam animadamente, ela fazia parte do cenário clicando aqui e ali. Cabecinhas juntas, amigas, denunciando cumplicidade e amores sinceros.

Passaram cinco anos.
O cabelo cresceu, vigoroso mas disforme. As flores murcharam, ficaram secas, esguias, quebradiças. A azáfama instalou-se. Os amigos mudaram hábitos e partiram sem dizer adeus.

Mar alto e as baleias

Rascunhado daqui.

Paulina adorava aquele cantinho. Sentada, sem companhia, sossegava os ímpetos da soberba. Bebia o café pausadamente, apreciando o sabor acre e o quentinho tão bem-vindo, reconfortante. E viajava. Por mundos de portas e travessas inventadas, ou então não, pessoas conhecidas mas sem rosto, se bem que tudo fosse mental.
No radio tocava a canção das baleias do Roberto Carlos, esse ícone do romantismo pobretão e reles. Aquela canção é um hino à conservação da espécie marinha, nada tem a ver com o amor entre humanos, entre homem e mulher, rapaz e rapariga.
Rapariga... Os acordes da canção transportaram Paulina a um lugar e tempo distantes. Lembrou-se de quando um rapaz giro cantou no Karaoke, de como desafinou, de como se riu de si próprio, pleno de graça juvenil. Era a balada das baleias, que vontade de dançar agarradinha, de se aninhar... E ele cantava tão mal, coitadinho, mas como estava divertido! Eram tão jovens... Os dois.
Paulina tinha um ar sonhador. Sorria. Inconscientemente ia mexendo no pacote de açúcar, a mão apoiando o queixo, enquanto na sua cabeça surgiam imagens duma época sobre a qual passaram décadas. Saudosista, viajou no tempo, a sua vida construía-se assim, memorial, todas as existências imateriais dentro da sua cabeça. Todas.

Lá ao fundo Amorim espiava todos os movimentos de Paulina. Curioso como estava manteve a atenção totalmente concentrada naquela figura sonhadora e apartada do mundo real. É então que Paulina dá pelo olhar de Amorim e fica muito ansiosa. Ele aproveitou esse olhar rápido e nervoso para entabular conversa, falando da música tão bonita e do quanto ela lhe pareceu sensível ao ouvi-la. Paulina ficou sem fôlego, a cara quase explodindo fogo vermelhão. Mas não fugiu. Respondeu lugares comuns sorrindo docemente, fingindo que Amorim não tinha importância nenhuma, mas lá no fundo queria falar com ele durante o resto da manhã, era tão raro alguém lhe dar atenção... Porém, não prolongou mais a conversa, sabia que aquele era um amor impossível. Ou uma espécie disso...

Parafuso a menos

O meu colega vende parafusos (por vezes um só) às pessoas que perderam um parafuso e desejam repô-lo...
Não é o máximo? As pessoas perdem um parafusinho aqui ou ali e depois têm de comprar um. Nunca dizem que perderam o parafuso da cabeça mas eu cá acho que sim. É que isto do balcão é giro: as pessoas não nos contam as coisas que nós gostaríamos de saber.

Histórias

«Estou a contar demasiadas histórias à volta desta porque aquilo que quero é que em volta da narrativa se sinta uma saturação de outras histórias que poderei contar e que talvez contarei ou que talvez tenha já contado noutra ocasião, um espaço cheio de histórias que quem sabe não são outra coisa senão o tempo da minha vida, onde me possa mover em todas as direções como no espaço encontrando sempre histórias que para contar seria preciso primeiro contar outras, de tal modo que partindo de um qualquer momento ou lugar se encontra a mesma densidade de material para contar. Melhor, olhando perspetivadamente tudo aquilo que deixo fora da narrativa principal, vejo como que uma floresta que se estende por todos os lados e não deixa passar a luz tão densa que é, enfim, um material muito mais rico do que aquele que escolhi para colocar em primeiro plano desta vez, de forma que não está excluído que quem segue a minha narrativa se sinta pouco defraudado vendo que a corrente se perde em tantos regatos e que dos fatos essenciais lhe chegam só os últimos ecos e reflexos, mas também não está excluído que precisamente este seja o efeito que me propunha atingir pondo-me a contar, ou digamos um expediente da arte de contar que estou a procurar adotar, uma norma de descrição que consiste em manter-me um pouco abaixo das possibilidades de contar de que disponho.
O que depois se verá é o sinal de uma verdadeira riqueza sólida e profusa, no sentido em que eu, se por hipótese tivesse só uma história para contar, andaria descoordenadamente à volta dessa história e acabaria por queimá-la com a mania de lhe dar o devido valor, enquanto que tendo de parte um depósito praticamente ilimitado de substância narrável estou em posição de manejá-la com distanciação e concedendo-me o luxo de me alongar em episódios secundários e em pormenores insignificantes.»

'Se numa noite de inverno um viajante', Italo Calvino

Página 105

sexta-feira, 23 de março de 2012

6326

Agora é aquele bocadinho de tempo em que publico uma fotografia. Cá está ela: crua e distante - como eu.

Póvoa de Santo Adrião, 23 de março de 2012

A montra

A montra de merda está pronta. Chamo-lhe assim mas não que a merda seja literal, antes por conter objetos alusivos ao WC e afins.
Coloquei o urinol com a boca direcionada para a frente, a jeito de bater com facilidade no olhar da maioria dos transeuntes. Logo veio uma senhora que queria um, queria um, queria um. Retirei de dentro da montra o dito objeto toda lampeira, o meu ser inteiro rejubilava porque aos dias de hoje as vendas escasseiam. Porém, a cliente desistiu da compra alegando que o orifício de entrada era demasiado largo, que o marido é que precisava dum daqueles mas tinha de ser estreitinho.

(Hum, ok...)

A mulher que vagueia pelo lugar da musa...

Rascunhado daqui.

Identifico-me com ela sem saber se o que daí advém é glorioso ou desprezível. É uma mulher que ciranda levemente, fingindo saber ou interesse em livros, folheando e revirando capas. Ninguém repara neste vulto franzino, excetuando eu, a que rebusca interesses para (d)escrever.

A mulher que não sabia descrever

Rascunhado daqui.

Ora bem, vamos ao preâmbulo: este post será (porventura e tendencialmente) uma amostra do quanto tenho a mania que sei e que uma sou boa e engraçada escrevente.

Falava com uma jovem mulher bastante viajada e possuidora de canudo académico. A conversa caíu num dos pratos mais tradicionais do mundo: piza. Ela logo fez menção de a sua pior experiência em pizas ter sido precisamente em Itália, a origem deste pitéu. Curiosa, expus os meus porquês; qual o sabor do disco comestível e o que a tinha desgostado. Ela responde que era 'horrível'. Quis saber mais, insisti. E ela não passou dali: 'horrível, horrível, horrível'.
Bem sei que 'horrível' é um adjetivo que basta para demonstrar o quanto esta jovem ficou impressionada pela negativa. Fez-me impressão, agoniou-me os neurónios, a miúda não me sabia explicar como era a piza que comeu... Eu queria mais, às vezes tenho estas curiosidades e/ou a minha imaginação está faminta de informação, em parte essa avidez – incongruente, quiçá- deve-se ao facto de escrever, por um motivo ou outro estou habituada a descrever.


O primeiro

Aqui estou, passadas mais vinte e quatro horas, provando a minha rotina diária.

Paro por aqui o assunto, antes que o estrague.

quinta-feira, 22 de março de 2012

O derradeiro

E regressei, cerca vinte e quatro horas depois do derradeiro post de ontem, tal como previsto e com algo a dizer.
Voltarei dentro de vinte e quatro horas para provar a semelhança dos meus dias.

Aquela pessoa

Há aquela pessoa que passa na rua e olha para ti, que estás aí especada e indefesa. Aparentemente aquela pessoa não quer nada do teu espaço mas depois de te olhar nos olhos, de ver a tua figura estática, imita-te e trava bruscamente os passos como se o simples facto de te ver lhe tivesse lançado ao cérebro um lembrete sonoro: quero comprar cânfora, quero comprar cânfora, quero comprar cânfora!
Aquela pessoa é estranha, tem o cabelo revolto e um ar lunático, tu não queres nada daquela pessoa, não queres olhar nem falar com ela, tens medo. Mas aquela pessoa quer-te pedir a cânfora porque viu os teus olhos e esses estavam a olhar para essa pessoa que quer cânfora mas não se lembrou de tal enquanto não te viu.

Fluxómetro

Ele queria lembrar uma palavra. Conversava com outro do mesmo género, importante e sabedor. Estes dois possuíam o ADN da mais alta estirpe e também sangue azul.
Vamos ao resto.
O primeiro deles queria tanto lembrar a palavra... Para enaltecer a sua personalidade e aquela espécie de demanda que ninguém o obrigou a possuir.

O outro, o do mesmo género, lembrou o vocábulo estranho:
É fluxómetro! Fluxómetro! - diz ele todo entusiasmado.
Eu já me ia lembrar a seguir - diz o primeiro, com o lamento meio escondido, que um ADN daqueles não se pode rebaixar.

Olhando

No metro demorei o olhar nos pés das pessoas. Aparentemente não tinha mais nada que fazer.
Um par de pés apoiados no chão, e calçados, revelam uma pequena parte da personalidade duma pessoa.
Se são desleixados(as) os sapatos têm a ponta e laterais junto ao dedo mindinho gastas, à falta de graxa.
Se são vaidosos(as) os sapatos apresentam grande qualidade, são bem acabados e lustrosos por demais.
Se são ocupados(as) mas detentores de algum brio com a figura os sapatos estão levemente sujos de pó.

quarta-feira, 21 de março de 2012

O derradeiro

Este blogue ficará inerte dentro de segundos. Prevejo uma ausência de cerca de vinte e quatro horas.

EU

Sou eu em demasiado. É demais, é assim que afasto as pessoas.

A criada da dona Alda, que é como quem diz: A dona Carminda, a bancária

Rascunhado daqui.

A dona Carminda estava toda chateada com a dona Alda porque esta tem a mania de fazer dos outros criados de si mesma e a dona Carminda não papa cenas dessas mas como tem de amochar por causa desse objeto de culto e reverenciador que é um balcão queixou-se à minha pessoa que é tão boa ouvinte e ademais a própria (é melhor salientar que esta própria sou eu porque este texto está a ficar confuso) tem um balcão na sua vida e sabe muito bem como são essas coisas de ter de baixar a mona e atuar pianinho...

Dia da Poesia

Ouvi no rádio que é dia da poesia. Não sou poeta mas às vezes tenho umas horas poéticas - se é que se pode chamar assim, credo, até me sinto a profanar os antros do poema...
Passaram vários anos sobre a primeira vez que me deu um baque do género, ainda não existiam diários e muito menos blogues na minha vida. Atravessava um momento difícil e por obra dum impulso que não sei explicar pus em pequenos versos o que sentia. Foi libertador.
Passo a publicar um poema de Florbela Espanca, 'Vaidade', que hoje ouvi declamar no rádio.



Vaidade

Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!

Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todo o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!

Sonho que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a terra anda curvada!

E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho...

E não sou nada!...


Florbela Espanca


Fonte: Projeto Releituras


O cliente

Ultimamente tem aparecido um cliente que se apresenta com alguma regularidade, não a suficiente para se fazer notar, antes tem um fator sui generis: fala em surdina mas ouve-se bem, digamos que é mais que um sussurro, é uma voz de sopro que lhe sai da garganta. E só fala com a garganta, a boca e as faces quase estáticas por completo.
Não sei para que raio é tanta amostra de galã, parece estar dentro dum personagem, ou assim...

À porta

Era uma vez um casal já com alguma idade que se apresentou ao largo da loja tal. O homem era muito tímido e calado, mal dizia as boas tardes e arrancar-lhe uma palavra dava trabalho. A mulher era toda séria e importante, não se relacionava com a ralé, para ela só acima da aristocracia é que valia a pena o esforço de lançar um simples olhar.
A senhora que trabalhava na loja tal estava a fazer a montra em cima dum banco e tinha de manter a porta meia fechada. Ou meia aberta, depende do ponto de vista. O casal estacou ali, não sabendo a senhora se queriam entrar ou estariam observando a montra, ou ainda, quem sabe, queriam vê-la trabalhar, já que uma senhora empoleirada se vê bem de qualquer lugar da rua e observar um poleiro é algo que as pessoas costumam gostar de fazer.
Não se contendo, a senhora da loja tal perguntou muito amavelmente se queriam entrar – o homem baixou a cabeça bruscamente e a mulher olhou para o lado empinando o nariz. A senhora da loja tal não quis dar importância a semelhantes atitudes, esqueceu a coisa e repete (muito amavelmente) se querem entrar. O homem revela timidamente e quase em surdina 'a gente era pa fazer uma chave...', e ao mesmo tempo ambos repetem os gestos, ele baixa os cornos, ela levanta a fuça. A senhora da loja tal insiste (é tão amável, esta senhora, e surda, afinal o homem já se tinha manifestado...) se querem entrar ela dá passagem. De novo a frase dele: 'a gente era pa fazer uma chave...' e os gestos dos dois: cornos no chão e fuça roçando o andar de cima...

Isto finda quando a senhora da loja tal (amável e um tudo-nada surda) ouve a frase, desce do banco e abre totalmente a porta para dar passagem ao casal.

A árvore

É da árvore, este post. Eu bem disse que ia tirar fotografias à árvore mais descrita neste blogue, a árvore amarela. Hoje que é o dia delas pus-me a caminho para os cliques. Eis o resultado.

Lisboa - Rua Cândido Guerreiro, 21 de março de 2012

Manhã

A meio da manhã a Praça de Espanha (Lisboa) cheirava a sopa em plena ebulição e gases de escape.

Leitura(s)

Não tenho coragem de dizer que não gosto ou gostei deste ou daquele livro. Reverencio tanto (tanto, tanto, tanto) a arte de escrever...
Mas a verdade é que não estou a gostar do livro 'Se numa noite de inverno um viajante' de Italo Calvino. Ler está a ser um sacrifício. O motivo é simples: é demasiado complexo, ora estamos numa história ora noutra, o autor pulula ao sabor da sua criatividade, compreendo, isso pode ter uma componente de génio, não duvido, mas desorienta-me. Não desisto da leitura porque sou teimosa, mas também porque sou curiosa e quero saber onde vai desembocar a história.
Não obstante, agradam-me alguns trechos, como o seguinte:

«O professor está ali à sua secretária; no cone da luz de um candeeiro de mesa sobressaem as suas mãos suspensas ou pousadas ao de leve no volume fechado, como que numa carícia triste.
– Ler, - diz ele,- é sempre isto: está uma coisa à nossa frente, uma coisa feita de escrita, um objeto sólido, material, que não se pode mudar, e através dessa coisa que faz parte do mundo imaterial, invisível, porque apenas é pensável, imaginável, ou porque existiu e já não existe, passado, perdido, inalcançável no mundo dos mortos...
– … Ou que não está presente porque não existe ainda qualquer coisa de desejado, de temido, de possível ou impossível,- diz Ludmilla,- ler é ir contra qualquer coisa que vai ser e que ainda ninguém sabe o que será... (…) O livro que agora desejarias ler é um romance em que se sinta a história que aparece, como um trovão ainda confuso, a história histórica juntamente com o destino das pessoas, um romance que dê a sensação de se estar a viver um turbilhão, que ainda não tem nome, não tomou forma...»

'Se numa noite de inverno um viajante', Italo Calvino

Páginas 74, 75

terça-feira, 20 de março de 2012

Penso eu de que

Se alguma vez tivesse pensado que sei escrever, hoje poderia pensar que já não sei escrever. Assim sendo, não sei o que pensar.

Nome de batismo: Lucrécia

A Lucrécia é uma senhora muito simples, assim como que sonsinha e com pouco ou nada a dizer. Uma vez ficou ali de volta dos porta-chaves que têm nomes. Virou e revirou enquanto quis, aparentando querer comprar um daqueles espécimes com o seu nome lá escrito. Encorajei-a a que me facultasse a sua graça pois eu procuraria (nas prateleiras de cima) com muito prazer o dístico nominal. Não quis. Riu, riu, riu. E riu. E depois ainda riu. Eu ria com ela, nada há mais contagioso que o riso. Entre risos ia-me dizendo que o nome dela não estava ali, de certeza que o seu nome não estava ali, e vá de dizer que era Lu, era Lu, era Lu. Tentei adivinhar, morta de curiosidade, só me lembrava de Lurdes e Luísa, nada mais. Fiquei a seco...
Isto passou-se.
Um tempo depois fiquei a saber o nome dela: Lucrécia. Desta vez já não rimos tanto. No minuto a seguir a provar o conhecimento, ainda mal mastigando o alívio duma curiosidade saciada, esqueci por completo o nome da mulher e a própria mulher.
Isto também se passou.
Talvez tenham decorrido meses quando ela voltou. Não me lembro como encetei a conversa, mas lembro que já não tinha o nome que ela achava para lá de esquisito e que ninguém tem na minha memória. Voltei a inquirir, cheia de risos contidos (esta senhora dá-me motes alegres...).
– Mas olhe que eu sei que você é Gina...
Diz ela. Insisto:
– Diga lá...
E ela quase grita:
– Sou Lucrécia! Lucrécia!
Mas ri, ainda assim, ri. Ela e eu.

Cabelos

Ela foi ao cabeleireiro. Estava a precisar dum miminho, de dar atenção à figura, estava mesmo a precisar.
Compreendo o motivo fulcral da visita, mas o cabeleireiro foi um querido, tamanha atenção e amabilidade teria sido o suficiente para mimar.

Trrim! Faturinha para o senhor doutor!

Na rua uma senhora atlética estendeu-me um papelinho publicitando um método holístico. Li rapidamente o conceito e engracei com o seguinte:

«Através de técnicas que aprimoram o indivíduo e de conceitos que refinam o comportamento.»

Eu preciso de trabalhar o corpo e a mente numa modalidade assim. Bem preciso de ser mais simples e desafogada...
Enquanto não me decido a avançar, limito-me a usar a campainha deste ginásio quando quero deixar um fatura na caixa de correio do senhor doutor e a sua secretária se encontra restaurando o estômago.

4 cêntimos

A menina do café vem ter comigo à mesa trazendo quatro moedas de um cêntimo na mão em concha. Alegremente faz-me saber que lhe tinha dado essas moedinhas a mais. Depois de receber - também eu alegremente – a mísera quantia tive um pensamento ruim:

«Ai estavam quatro cêntimos a mais? Estavam? Ai sim?! Se fossem quatro euros não vinhas devolver, não...»

Conclusão: é assim que o ser humano transforma um mundo maravilhoso num reles e podre espaço.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Dia do PAI

Dia do PAI Dia do PAI Dia do PAI Dia do PAI Dia do PAI

hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai hoje é dia do pai...

A tristeza

Estou triste e sei porquê. Revelar o motivo não acrescentaria nada de bom. Estou triste. E pronto. Amanhã estarei melhor, é essa a esperança que mantém as pessoas tristes em pé.

Rascunho


A história da folha de teste da impressora e do valor / desvalor que a minha escrita tem;


Soltei um gritinho de prazer quando vi a folha de teste que a impressora caseira cuspiu. Demorei o olhar nas letras alinhadas e definidas, tão bem desenhadas, e nos quadradinhos coloridos brilhantes e ordenados.
Já chega de enaltecer, não?!
Maravilhada com tamanha beleza agarrei na folha. Logo diz a rica filha em tom de gozo:

– Oh! Vou fazer um post no meu blogue: eis a folha de teste da minha impressora...

E blás... Ora caraças! Raios partam esta mania de escrever...

Dentro do seio familiar e grupo de amigos nunca serei reconhecida como bom exemplo de aspirante a escritora, ou sequer detentora de notória criatividade literária em termos de bloguista. Podia ser ao contrário mas não é. Os de fora é que me dão valor. Podia ser ao contrário mas não é.

Argola(da)s

Uma cliente chega aqui e diz:
– Quero vinte... Ai, vinte não, dezanove argolas para chaves.
Horas mais tarde, outra cliente chega aqui e diz:
– Quero vinte argolas para chaves... Ai, vinte não, dezanove.

Logo que ocorre o segundo pedido...

Uma vendedora expedita obriga-se a manter a boca calada, não vai logo a correr perguntar se não será amiga ou conhecida ou o que for da outra e esteja a duplicar o número de argolas e a gastar dinheiro inutilmente.
Uma vendedora parva faz-se muito amiga e manifesta essa alegre amizade perante quem não conhece de lado nenhum perguntando veja lá e coiso é que esteve aqui uma senhora há umas horas e levou exatamente o mesmo número de argolas, serão colegas ou isso?

Se sou uma vendedora expedita ou parva ficará em segredo... A não ser que o leitor me peça expressamente que divulgue o verdadeiro epíteto.

Enganadora

Quando me engano estou três meses a ser perseguida. Levando em conta que me engano todos os dias...

Sentimentos

Estar deveras tramada com uma situação e absolutamente sozinha para a enfrentar...
... é lixado.

Os problemas são aborrecidos. A solidão é terrível.

Música na cabeça

A dona Adelina entrou em passo lento e silencioso como é seu costume. No radio tocava uma das canções do momento, dei-lhe a ouvir Sia com David Guetta na música 'Titanium' e perguntei-lhe se gostava do som. Sorriu, maliciosa. A dona Adelina consegue pôr malícia em tudo.
(E também é verdade que eu estico um bocado a corda, dou-lhe atenção, mostro um interesse desmesurado naquilo que diz, o que a leva a mostrar a malícia.)
Sim, gosto muito - diz - parece a canção daquele médico que morreu...
Do Carlos Paião? - ajudo.
Sim, esse! - responde ela, quase eufórica. - Mas não me lembra o nome da canção...
A 'Cinderela?'
Sim!- voltou à carga, euforia novamente. - Tenho a cassete lá em casa, de vez em quando ouço, tenho a letra na ponta da língua, nem sei como tenho cabeça para aquilo!
Não tive coragem de desmanchar o prazer da dona Adelina, é claro que as duas canções não são nada parecidas...



Fonte: http://letras.terra.com.br

Dá lá beijinhos!

Encontrei-o por acaso. Está magrinho, enrugado e sombrio. O cenário era um talho de bairro, incrivelmente. A magreza a misturar-se com a alimentação. Os olhos azuis, esses, continuam vistosos. À despedida mandei beijinhos à esposa.
– Dá beijinhos à Zélia.
– Não, à Zélia não! - Diz ele perentório e indignado. Tão indignado que parecia zangado. - À Zélia não porque estamos separados há quatro anos!

Pronto, 'migo, deixa lá isso, ok? Há quatro anos, hein? Pois é, passa rápido... Mas vamos ao que interessa: então ainda não arranjaste ninguém para te atazanar o juízo?! Não me digas, pá!

Comezainas que faço e/ou invento

Petit Gateaux

200 g de chocolate para culinária
150 g de manteiga
50 g de farinha
3 gemas
4 ovos
75 g de açúcar

Derreta em banho-maria o chocolate e a manteiga.
Retire do lume, mexa, junte as gemas, mexa bem. Junte a farinha e mexa muito bem.
Bata os ovos inteiros com o açúcar durante cinco minutos, junte a mistura de chocolate e misture tudo muito bem.
Divida a massa por forminhas (8-10, aproximadamente) untadas de margarina e polvilhadas de farinha durante 10 minutos a meio do forno que se deve ligar a 180º antes de iniciar a feitura.
Retire do forno, deixe arrefecer um pouco, desenforme para pratos individuais e sirva decorado a gosto.




Decorei com morangos, hortelã e uma glace que inventei:

200 ml de natas geladas
250 g de queijo mascarpone à temperatura ambiente
100 g de açúcar em pó
1 colher de chá de essência de baunilha
1 colher de chá de canela em pó

Batem-se as natas com o açúcar até se formarem picos. Juntar o queijo e só depois de tudo misturado adicionar a baunilha e a canela.

Nota: a receita dos gateaux foi retirada duma embalagem de chocolate para culinária Nestlé.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Imagem de marca

Esteve cá o homem que me trata do computador. Aquele que, sem o saber, mantém esse objeto em pleno funcionamento para que seja um dos alvos dos meus dias em duas vertentes: trabalho e escrita (leia-se lazer, em querendo).
Mostrei-lhe a imagem (ver abaixo) do ambiente de trabalho. Sorriu, sem emoção, como que para fazer jeito à pobrezinha. Lamentavelmente. Mas lamento menos que o do post anterior.



Nervoso

Aparece sempre nervoso. A voz treme e os dedos também. Não é nada comigo mas tenho pena, é agradável atrapalhar a vida dos outros.

Cigarrar

Ele mantinha o cigarro aceso na boa. Ao meio. Sem retirar nunca. Chupava. Expelia. Chupava. Expelia. O cigarro ali, entre os dentes da frente. Chupava. Expelia.

E era isto.

'E era isto' é uma maneira de terminar um texto quando não sei que escreva como seguimento, complemento ou terminação.

Ah pois!

'Ah pois' é uma maneira bem-disposta de terminar uma explicação que ninguém pediu.

Pombo-sem-Correio

Um pombo apeado movia-se freneticamente, arrulhando, inchado e másculo, com a libido em perfeita erosão, cheio de desejos animalescos, dirigia-se à minha atenta e curiosa pessoa.

Ó 'migo, é assim: a gente não se ia dar lá muito bem... Por causa da raça, 'tás a ver?

Comezainas

Os antiquários falavam de gastronomia enquanto almoçavam. Pareceu-me alinhado. Puramente simples. E outras coisas aborrecidas.

Árvores

A árvore mais comentada por estas bandas não tem uma única folha. Já outras mantêm uma farta folhagem, ou como que uma leve penugem verde. Todas lindas. A mais comentada também, apesar de completamente despida. Quando lhe nascerem folhinhas a ver se tiro uma foto.

Introduzir

Era uma vez um senhor que fazia umas introduções do caraças...

'Tenho lá em casa uma espécie de florão...'

'Sabe o que é? O problema coloca-se ao nível do...'

quinta-feira, 15 de março de 2012

Não queres escrever?

Queres escrever da avenida mais pequena de Lisboa?

Não.

Queres escrever da cigana aos gritos com o polícia?

Não.

Queres escrever da senhora assustada com os números do exame de oncologia?

Não.

Queres escrever do homem que te cuspiu para a cara?

Não.

Queres escrever do jovem extraordinário que estava no lugar da musa?

Não.

Queres escrever do granizo d' hoje?

Não.

Então e da beleza floral destes dias luminosos? Ontem esqueceste-te...

Não.

Queres escrever...

Não!

quarta-feira, 14 de março de 2012

A grande viagem

Andávamos nos preparativos para a partida do meu pai em trabalho para a Arábia Saudita. Era Abril de '79 e em minha casa reinava um ambiente tenso e triste. Apesar de naquela altura não passar duma criança, apercebia-me desse ambiente, também eu sentia saudades do meu pai, mesmo antes de ele partir. Ia sentir a sua falta à mesa quando chegasse a hora do jantar, não poderia contar com o seu saber para me esclarecer eventuais dúvidas escolares que surgissem, sabia que a minha mãe e o meu irmão iriam andar calados e deprimidos. Na verdade só a ideia da partida era já um vislumbre desse estado d' alma, só esse vislumbre me entristecia por demais, causando-me uma sensação terrível de impotência, não havia nada que pudesse fazer para minimizar o desconforto emocional que todos sentíamos.
O meu desejo mais íntimo era ir com o meu pai naquela viagem, não queria estar longe da voz, da presença, da segurança que ele me transmitia. E sentia uma curiosidade imensa acerca do sítio para onde ele ia trabalhar: Arábia Saudita. Queria tanto ir... Como seriam as pessoas, os lugares, a língua?
No meio de toda aquela azáfama tive uma ideia, uma vez que não podia viajar com o meu pai, enviaria algo que fizesse a mesma viagem.

1. Fui buscar um saquinho de pano que fizera algures durante as férias de Verão com restos de tecidos da minha mãe.
2. Arranjei uma pedrinha branca algures. No quintal, na pequena horta, na estrada poeirenta, no pátio da escola?

Estes dois itens não sei como se ligaram, ou como formei o pensamento. Mas posteriormente atuei e, ao que parece, foi assim:
Não podia ser uma pedra qualquer, tive o cuidado de escolher uma pedra perfeita, redonda de tão polida. Achei que seria giríssimo depois, quando o meu pai voltasse das arábias, eu ter na mão algo que tivesse estado nesse lugar tão longínquo e igual a coisa nenhuma das que conhecia, por isso inimaginável.
Pus a pedrinha dentro do saco e fui ter com o meu pai. Emocionada, pedi-lhe que levasse o saquinho feito à mão com a pedrinha especial, que o guardasse na mala de viagem. Não foram precisas grandes explicações, ele entendeu imediatamente o meu gesto. Sem desdenhar da minha infantilidade compreendeu que eu queria mandar algo que o fizesse lembrar de mim enquanto estivesse fora, algo que fosse e viesse com ele e que estivesse com ele, onde ele ia estar, assim pareceria que efetivamente eu viajara até às arábias. Ainda hoje recordo a sua expressão calma e ponderada quando me respondeu:
- Está bem, filha. O pai leva e traz este saquinho com a pedrinha. Vou pô-lo aqui dentro da mala, vês? Depois quando eu cá chegar mostro-to.
Hoje sei que não era preciso ter mandado um saquinho na mala de viagem para que o meu pai não me esquecesse enquanto estivesse fora, ele iria estar com a família no pensamento ininterruptamente.
Quando regressou, cinco meses depois, mostrou-me o saquinho com a pedrinha lá dentro. Foi com uma expressão fraternal que me perguntou:
- Lembras-te de me teres dado isto? Toma, está aqui. Foi e veio comigo.
Fiquei completamente maravilhada, a sensação não estava nada longe do que idealizara aquando do pedido. Segurei no saquinho e pensei: " Que giro! Isto esteve tão longe!... Foi e veio... E agora está aqui comigo!..."

O meu pai é sensível, ponderado, observador e inteligente. O meu pai é tudo isso num grau elevado. Quando envelhecer quero ser como ele.

Texto enviado para o blogue Fábrica de Histórias 

E porque o supra senhor Blogspot é maravilhoso...

… Seguidamente irei escrever algo referente ao próximo post. Estou com os olhos no futuro, portanto.

Descobri um blogue onde podemos deixar textos alusivos a determinado tema. Chama-se 'Fábrica de Histórias'. Qualquer semelhança com... Quero lá saber!
No 'Fábrica de Histórias' podemos deixar linques que viajem até um texto no nosso blogue. Qualquer semelhança com... Marimbo!
No 'Fábrica de Histórias' os temas mudam a cada semana. Ainda bem. Gosto que não haja muito tempo para escrever. Gosto da rapidez, do flashe, das sensações que advêm da celeridade.
O texto acima deste post é uma versão modificada dum outro que escrevi vai para quatro anos (21 de março de 2007).
Retrata uma época da minha infância e uma faceta muito especial do meu pai.

Não me é aprazível modificar textos meus, parece que cometo uma espécie de adultério, estou ciente que um texto publicado já não me pertence.
Hoje escrevo doutra maneira, mais compacta, direta e também mais cuidada, digamos que o texto original mostra uma personalidade e um modo de estar perante a escrita que não coincide com o presente. Por isso fiz as alterações.
Vamos ao básico: os dois parágrafos acima mais não é do que uma maneira coerente de dizer que o meu desejo era melhorar o texto.

Para os curiosos, o linque para o antigo texto é este: O Meu Pai

O prazer

Há uns que desenham os sonhos. Os sonhos maus. Dão-lhes a forma e desse modo deixam de temer.
Há outros que escrevem. Escrevem dos pensamentos e dos fantasmas. O motivo é o mesmo, se escreverem o temor desaparecerá.

Milena é uma mulher que gosta de escrever. O ato fá-la esquecer as amarguras e atenuar - quiçá extinguir - o sofrimento. Mas o principal motivo da escrita é a torrente de contradições:

As infimidades podem ser engrandecidas. As grandiosidades não, essa transformação não dá prazer.

O enredo inexplicável

Vá lá, não me interpretem mal, é que estou enredada. Bastam-me as pessoas que não entendem nada e a quem eu não posso explicar coisa nenhuma.

Ver

Estás a ver como tu és?

Não. Arranja-me um espelho, por favor.

Bilhete de ida

Tenho dois bilhetes de metro. Um está vazio de viagens, o outro não sei.

terça-feira, 13 de março de 2012

Apartamento

Tenho horror a fazer parte – política, religião, clubes – mas essa ideia não é de todo verdadeira. Há cenários em que são os meus congéneres que não desejam a minha presença.

Ó tempo volta p'ra trás!

O tempo podia andar para trás. Estou certa disso. Ele é que não quer.
O tempo andando para trás – apenas e especialmente para a minha pessoa - eu teria saído de casa noutro minuto, o que faria com que aquele cabrão da camioneta da câmara chegasse ao jardim numa altura em que eu não estivesse a estorvar a passagem. O dia não teria aquele percalço, estaríamos ambos - o cabrão e eu – mais felizes, aproveitando as correntes da natureza e o esplendor da vida.

10 minutos

Ó Gina, tens de ir ali assim, quando é que vais?

Daqui a dez minutos.

Hã?!

Daqui a dez minutos.

Hã?!

Daqui a dez minutos.

Hã?!



… ?



Olhe, vá andando que daqui a dez minutos ela vai lá.

Nas tintas

Vende tintas? (cliente aparentemente desenvolto e direto)

Sim. Para parede, madeira, metal... (balconista prestativa e orientadora)

Não é tintas que eu quero... (desmoronamento completo da aparência, grande hesitação, enorme dificuldade no desembuchar, andou ali às voltas que tempos!)

E não quer dizer-me o que quer comprar? (balconista agarrou na desenvoltura que o cliente havia jogado fora)

Pensão à vista(?)

A dona Marília veio perguntar do carteiro, que ainda não havia chegado a boa nova: a pensão. Pensãozinha do mês, não é que seja muito, coisa pouca, poucochinho, não dá para nada.
É dia 12... Sabe que a gente começa a sentir a falta..., diz ela.

E desenrola a conversa do costume. Pergunta por mim e pelos meus. A dona Marília tem uma memória extraordinária. As perguntas são sempre as mesmas. Sempre, sempre.

Quantos meninos tenho...
Se já são crescidotes...
Que idades têm...
Se é um casalinho...
Qual é mais velho, ele ou ela...
Se já namoram...
Se já casaram...

Quando este diálogo termina, repete outro. Diz que sou uma querida, uma joia de senhora, muito simpática.
Hoje até tem uns brilhozinhos!, remata ela, com uma alegria tão sincera que me comove. A dona Marília vê muito mal, os brilhozinhos que ela viu foram os meus brincos, duas bolas enormes e prateadas que dão nas vistas porque abanicam ao mais pequeno movimento de cabeça...

E eu cheia de receios!

Olha só como está bem explicado e nada ofensivo. E eu cheia de receios!


Vou decorar este texto, apenas removo o 'azeite' e di-lo-ei frente aos meus clientes. Farei um figurão, claro.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Hoje

Este é um texto publicado com um intuito: em chegando a posteridade lembrar-me-ei com que linhas me cosi nestes dias.

A grande maioria dos posts de hoje foi escrita na quinta-feira e na sexta-feira passadas. Não os publiquei na data da criação porque estava birrenta – não queria que me 'vissem' e tinha-se instalado o sentimento de inutilidade, estado baço que me assola a alma (ou a tola!) lá de quando em quando e que faz com que me recolha.

E porque andei arredada destas lides,

(ninguém notou, ninguém manifestou falta ou saudades, o que lamento, não pouco)

fui dar com um papelinho dos meus onde escrevi um tópico, dentro dessa maravilha suprema que é tudo quanto escrevo, sim senhores, mas não me lembro do desenvolvimento que lhe queria dar.
Está escrito a vermelho, o que não significa que esteja a mandar alguém à merda

(nos meus tempos de infância ouvi que para mandar alguém à merda subtilmente escrevesse-se em vermelho).

Não ligo às cores com que escrevo, marimbo. Limito-me a jogar a mão ao pequeno contentor de canetas e pegar ao calhas, cingir-me à casualidade. Conquanto possa anotar pouco me importa o colorido que dou às frases.
Fica a imagem, portanto.


Desejo

Queria tanto (tanto, tanto, tanto) frequentar um curso de escrita... Sinto a falta de convívio dessa natureza, ao momento parece que estou sempre a escrever do mesmo, a minha vida não muda, nem estou no limiar da loucura. (Quando estou nesse ponto a vida é como eu quiser, consigo transformá-la.)
Queria experimentar novos meios, modos, estilos de escrita. Queria não estagnar. Agora é essa a minha sensação, estou numa poça lamacenta, suja, quieta, prestes a apodrecer. Ao redor não há cores nem cheiros nem formas diferentes, a manhã apresenta-se nevoenta, a tarde difusa. Uma agonia...

Instinto

Ele queria dizer que o instinto impele as pessoas a usar as competências adquiridas mas o léxico não chegava até aí. Engasgou-se e usou o 'coiso' como forma de desembaraço.
Ela ajudou, ali pelo meio: instintivamente.
Ele engasgou-se no 'coiso' novamente.
Ela repetiu: usam o instinto.
Ele disse que não era isso, é que as pessoas... 'coiso'!

(Oh céus!)

No princípo → Podia ser o verbo... Mas não é!

Tudo começou quando a senhora doutora me disse, à laia de remédio e / ou resignação conclusivo(a):
' Isso são coisas que a sua cabeça tem necessidade de dizer.'
A partir daí tudo se transformou. Eu tenho necessidade de dizer, ok? Desabafar, extravasar. Então aturem-me, vá. Não custa nada, 'migos.

Sonho

Tive um sonho erótico. Contei-o ao meu melhor amigo. Amigo, sim. Para começar, não tenho amigas, para acabar, um homem é melhor ouvinte destas coisas.
Ficou deliciado, queria mais. Especulou pormenores, demorou o olhar nas minhas pupilas...

O senhor Jorra e a sua empresa

É familiar, esta empresa. Mas não totalmente. O escritório é uma sala enorme, onde trabalham cinco pessoas. Cada uma tem a sua secretária, um amontoado de papéis, vulgo trabalho, e cabos, fios e fichas. Mas tudo muito espaçado. E imaculado.
Sempre que lá vou, deslumbro. Primeiro com o espaço e a (aparente?) calmaria entre colegas, depois com o cheiro que emana da cozinha. Almoçam todos ali, em (são?) convívio.
O senhor Jorra é quem abona as comezainas, certamente... Um patrão à antiga? Afirmativo.
Ao tempo que não via este senhor e o seu império. Cumprimentou-me respeitosamente, como sempre faz. Perguntou por tudo e todos: pelo negócio e pelas pessoas que ambos conhecemos. Eu respondia e ele repetia as minhas frases, como que para gravar na sua cabeça, pareceu-me que só assim assimilava os factos. Está velho, o senhor Jorra. Ele também...

Numa das paredes está fixado um quadro com a seguinte frase:

Vida longa para os meus inimigos, para que assistam de pé à minha vitória

Convívio insano

Não se iam poder juntar todos no mesmo sítio. Uns falariam da igreja, outros manteriam a conversa de ginásio.
Ele e ela, os anfitriões, poderiam entrar em ambas as conversas. Ninguém conhece as suas capacidades. Porém, têm assunto. Os outros é que não sabem...

Falando por mim: estou habituada a que não me reconheçam as competências e as capacidades, comecei a aprender assim que iniciei o letivo, aos seis anos de idade. Primariamente, os outros são sempre muito melhores que eu. Dou nas vistas apenas ulteriormente.

Dias de um ginásio

Era dia (internacional, mundial?) da mulher, 8 de março. Um rapaz entrou na sala disposto a fazer a aula de stretching. Uma sala cheia de mulheres, diga-se. Não se privou de nada, esforçou-se ao máximo nos exercícios que habitualmente se fazem naquela aula.
No meio de mulheres. No dia (internacional, mundial?) da mulher, 8 de março. Ele ali, sem se fazer rogado, procurando sentir dor e tudo. Quando supôs que não estaria posicionado da melhor maneira buscou ajuda à professora, que solícita, se encarregou de o fazer sofrer os horrores que as suas colegas de sala sentiam. Tal e qual.

O ponto de interesse

Imagino que a escrita torne as pessoas interessantes. Mas não necessariamente por causa do escrevente, antes pelo leitor. O leitor é que descortina o interesse que o escrevente não sabe que existe.

Cinco

Das 16:06 às 16:11 estive entretida comendo laranjas.
O número de minutos são cinco. Já o número das laranjas... Fica em segredo.

Ser

Não sou como elas. Não me misturo, é mais por aí, que eu cá não tenho a mania que sou diferente.

Aborrece-me que me desdigam. As pessoas aborrecem-me. Qual a vantagem do desdito? Não é melhor ouvir as ideias pondo de lado essa ânsia de contrariar?

(Ao que parece, sou diferente...)

Quente, quente, quente!

O calor chegara. Porém, não tardaria a abalar, contrito, pela patada que dera ao amigo frio.
Milena e os calores. Milena tinha calor. Oh céus, que calor!
E a senhora, sentada no sofá preto, de perna aberta, escanchada, desavergonhadamente. Está calor. Pois é. Arejar é preciso.
Não! Milena não queria tal vislumbre. Mas tinha de ser... A menos que fechasse os olhos. Sair dali também podia ser uma boa ideia. Pois bem. Foi-se.

Ilegal

Cometi uma ilegalidade: fiz-me passar por outra pessoa telefonicamente. Era uma questão social, sem a mínima importância ao nível monetário, ou assim, o estado não ficou mais pobre nem nenhuma de nós mais rica.
Custou-me horrores... Bolas, como custou! Não tenho jeito nenhum para mentiras. Mas era preciso, o que prova a minha ideia de que todos os seres humanos são capazes de tudo. Todos, tudo, sem exceção.

Ele

Penteado pingão,
disforme.
Andar desengonçado,
sem norte.
Agradabilidades?
Pontos de interesse?
Pois é, não deu tempo...

O anónimo

'Ele* viajou na internet e cheguei aqui.'

Alguém deixou o comentário acima neste post.
Quando ia aprová-lo cliquei no sítio errado e eliminei-o. Então, muito respeitosamente, publico-o deste lado do blogue.

*O meu blogue.

6 7 8

Dia 6

Ah, eu queria fitas para as janelas. Mostre lá... Esta aqui, é esta mesmo. Ponha de parte, que eu venho buscar amanhã.

«Ponho de parte mas é o caraças...»

Dia 7

Venho buscar a fita. Tem Multibanco? Ah, então tenho de vir buscar amanhã. Mas ponha de parte. Ponha aí, assim já sabe que é isto que eu quero. Ponha aí. De parte. Oh, esta aqui, ponha de parte.


« Ponho de parte mas é o... Ok, eu ponho de parte, vá.»

Dia 8

Vem buscar a fita, ?, pergunto eu dum só fôlego.

Sim. (Sorri, malicioso.) Aqui tem tudo, continua ele, ferragens, pinturas, detergentes, chaves... Eu também fiz chaves, uma vez... (Que ar tão nostálgico, oh céus), quer dizer, a minha mãe é que tinha um estabelecimento...

A mãe dele tinha um estabelecimento e ele brincou às chaves uma vez. Aquele olhar saudoso deve-se à vez única, presumo. 

Prémio


A Olinda do blogue 'A Casa do Alfaiate' voltou a destacar o meu blogue com um prémio, o Prémio Dardos. Obrigada, Olinda.


"O Prémio Dardos reconhece os valores que cada blogueiro mostra em cada dia no seu empenho por transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais... que, em suma, demonstram a sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre as suas letras, entre as suas palavras."

Vamos às regras:

A aceitação deste reconhecimento implica três regras:
1- Se aceitar, exibir a imagem.
2- Linkar o blog do qual recebeu o prémio.
3- Escolher 15 blogs para entregar o Prémio Dardos.

Vamos ao resto:

Não escolho blogues para premiar porque não leio 15 blogues com a regularidade suficiente para os incluir nas regras. Então nomeio os blogues que efetivamente leio e que estão lá em baixo na lista.

Limas

Incrivelmente, a senhora que compra limas de cartão cada vez que cá vem, hoje deu-lhe para comprar pratinhos para vaso. Verdes.

domingo, 11 de março de 2012

O fotógrafo; fotografar; cliques

A ideia inicial é escrever um texto acerca de fotografia com o intuito já definido de o enviar para o blogue 'Fábrica de Letras'. Então... Eu que escreva.

Na ponta da divisória, junto ao semáforo, que se encontra fechado para os peões, é onde ele está. Naquele cantinho onde é improvável que alguém se mantenha quieto, aí mesmo. A avenida mostra-se movimentada: pessoas, carros. O vaivém é constante mas também habitual e característico desse pedacinho empedrado, bem como desse preciso minuto.
Ele está ali devido a algo, há um interesse no olhar, um esticar de pescoço e uma máquina fotográfica nas mãos. Tem um ar paciente e descontraído, muito embora desassossegado, expectante. O alvo é verde e amplo. Espera um pouco, eleva a máquina e clica. No melhor momento. E clica. E clica.
Deixa cair os braços, larga a pose de fotógrafo, daquele fotógrafo que descontrai mas não deixa de ser fotógrafo, essa pose aí, apoia a máquina na perna direita, porque é destro, pressionando os dedos contra aquele rebordo que as máquinas 'como deve ser' têm. Continua a observar, não vá ter escapado algum pontinho interessante do espaço nu e verdejante.
Enverga um blazer desportivo, cá está a descontração uma vez mais, e uma t-shirt por baixo, cá está ela, a descontração, de novo. É um profissional, indubitavelmente. Um criativo que tem de se apresentar bem vestido, há-os assim.

Para fotografar é mister a dita descontração, tem de existir. Quer sejamos profissionais ou então não. Como eu. Eu gosto muito de fotografia mas talvez não goste tanto assim de fotografar, em certos dias ou momentos falta-me a dita.
Fotografias são segundos fixados num pedaço de papel ou tela de computador. Fotografar é clicar e pronto. Já está. Tudo é fotografável, reproduzível, transmissível através das imagens. Na sua essência é isto.
Fotografar é um pouco como escrever. A gente escreve e dá a ver, acontece, porém, que nem sempre o recetor vê como nós.

E porque fotografar é clicar e pronto, e porque a descontração às vezes anda por aqui, abaixo estão fotos tiradas em Mafra, no passado domingo, dia 4 de março. Olhei o horizonte, as linhas e contrastes, pareceu-me bem no olhar... E clique, três cliques. Descontraidamente.



Arranjinho poético

Como fazer um poema dadaísta

«Pegue num jornal.
Pegue numa tesoura.
Escolha num jornal um artigo do tamanho que pensa dar ao seu poema.
Recorte o artigo.
Recorte em seguida com cuidado cada uma das palavras que formam o artigo e ponha-as num saco.
Agite suavemente.
Agora tire cada recorte, um após o outro.
Copie conscienciosamente pela ordem em que tenham saído do saco.
E o poema parecer-se-á consigo.
E você é um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade enfeitiçante, ainda que incompreendida pelo vulgo.»

Fiz um 'poema' seguindo estas instruções: recortei as palavras, retirei-as do saco e transcrevi-as conscienciosamente, como descrito. Apenas pontuei e quebrei as linhas onde me pareceu melhor, para dar um toque verdadeiro e vivo. Pu-lo abaixo propositadamente. Digamos que é uma estratégia para que o leitor não me abandone e leia este trecho.
O jogo de palavras parece-se um pouco comigo, sim senhores. Parece-se no final, que é misterioso, assim como eu.
Não tenho essa certeza (a de ser misteriosa), mas já algumas pessoas me disseram que apresento essa índole. E, sendo que os outros nos conhecem numa perspetiva diferente mas verdadeira, o melhor é acreditar que sou assim.
Deixo agora uma frase de Marguerite Duras que consta no mesmo livro:

«Os homens gostam das mulheres que escrevem. Pensam-no, mas não o dizem. Um escritor é um país desconhecido.»

O dito 'poema'

Padre!
Qual casar?
Selvagem piropo!
Ela dois mundo(s?) ouviu... e compras
Realizar dinheiro
Conheço segredos
Se equilíbrio?
Se queres realizar!
Confessar-se?
Tenho fantasias...
Engraçado, fantasias...
Romântico, reage!
Sexo o...
Para conversa(s?) imensas depois
Momento me faz...
Tenho que não...
Meus...
Da...
Dos...
Não!
O Pessoa,
(mais pagar uma)
Viveria, diria: o como já?
Gostar...
Imensas levar!
Fosse... Foi numa...
Ainda hoje acabasse loja
Ao...
Foi...
Peço se confesso
Por padre está o pagar
Os...
A?
No?
Com que tem amor?
O faria... Que por... O que... E... O... Ao...





Nota 1: Recorte duma entrevista a Rita Ribeiro e digitalizado a partir do jornal 'Correio da Manhã' de 14 de janeiro de 2012

Nota 2: Referências literárias retiradas da obra 'A Oficina dos Escritores', Francis Amalif.

quarta-feira, 7 de março de 2012

O fim

Há umas semanas que tenho vontade de deixar o blogue em paz, largá-lo da mão, deixá-lo sossegadinho, pairando na blogosfera, inerte, adormecido... Morto. Estou cansada. Extenuada, seriamente. Não de escrever, de blogar.
No entanto, há sempre algo a acrescentar à minha página virtual, as minhas histórias não cessam. Ficará sempre algo por escrever. E esse sentimento leva-me a continuar com o blogue, sistematicamente.

(Não sei como faço isto mas é assim que me acontece. Se parar agora sinto que fica algo por fazer. Se parar agora, hoje, dia de aniversário do meu balcão, ainda será pior, muito embora não saiba explicar porquê. Só sei que é aqui que as 'coisas acontecem'! E que é por causa deste lugar que eu tenho de escrever, é impreterível... Inexplicavelmente.)

Nunca terminarei este 'trabalho'. Ademais, tenho histórias e textos meio feitos. Falta-me acabar a história da Paulina e do Amorim com suas baleias;
a da rapariga pouco descritiva;
a da dona Carminda esbaforida com o desplante da dona Alda;
a da folha de teste da impressora e do valor / desvalor que a minha escrita tem;
a da senhora que vagueia pelo lugar da musa...

É infinito, como a vida.

80

Castro Verde, 7 de agosto de 2011

Não é meu costume assinalar no blogue outros aniversários para além dos quatro cá de casa. Não sei porquê nem me interessa aprofundar.
Porém, hoje há um aniversariante, já de si especial, que hoje completa uma idade redondinha → o meu pai. Oitenta, são os anos de vida dele. Parabéns, pai.

O meu pai pode não figurar em termos de aniversário mas consta em muitos posts. Querendo ler, é só escrever 'o meu pai' ali em cima no espacinho para pesquisar e pumba! Chegarão muitos itens mostrando o meu  pai, a pessoa que ele é e o que significa para mim. Ou então para ser mais fácil e certeiro, o leitor clique aqui...

O meu patrão é velho

Continuando na onda do aniversário (ver post anterior)

O meu patrão é velho, sim senhores. Raramente falo dele aqui, mas não que tal honra lhe seja imerecida, é por causa da privacidade.
O meu patrão é fixe. Deixa-me escrever aqui. Não que conheça a presença deste blogue, ou a importância que o mesmo tem para mim, mas vê-me escrever e não se importa nada com isso, aos dias de hoje já deve ter percebido que gosto de escrever, pelo menos isso.
O meu patrão é fixe... E velho. Delega em mim muitas das tarefas que mantêm a loja a funcionar. E a loja funciona. Plenamente. E eu tenho um blogue, sendo que uma grande parte é criada no tempo que aqui passo. O facto de não ter colegas permite que me organize de modo a trabalhar e escrever sem que prejudique ninguém.
O meu patrão é... Se um dia este blogue desse em livro ia ter de lhe fazer uma dedicatória.

A idade adulta


O meu balcão faz hoje 18 anos. É a segunda vez que registo esta data, se bem me lembro. (E lembro-me bem, ver aqui)
Em 18 anos aprendi muitas coisas, há ensinamentos que já não esqueço, há outros a que não ligo, muito embora sejam importantes. É feitio, prefiro pensar assim.
Estou a lembrar-me que há 18 anos era um bocado diferente... Mas se calhar não sou / estou assim tão diferente. Serei? Estarei? Hum...
Sim, sou e estou diferente, refinei algumas facetas da minha personalidade. Agora tenho mais paciência, mais palavreado, mais simpatia, mais ousadia, mais ligeireza. E também sou mais hipócrita, o que é uma chatice...

18 anos. O tempo máximo que um(a) funcionário(a) permaneceu neste estabelecimento é meu. O que não me traz vantagem alguma, ou prazer especial. Só se for um gostinho amargo devido a uma vingançazinha surda que anda cá dentro aos saltos de vez em quando...

terça-feira, 6 de março de 2012

Prenúncio

Lisboa - Rua Brito Aranha, 6 de março de 2012

Lisboa, 6 de março de 2012


LXXII

Se todos os rios são doces
donde tira o sal o mar?

Como sabem as estações
que devem mudar de camisa?

Porque são tão lentas no inverno
e tão palpitantes depois?

E como é que as raízes sabem
que devem subir para a luz?

E em seguida saudar o ar
com tantas flores e cores?

É a mesma primavera
que repete sempre os eu papel?

'Livro das Perguntas', Pablo Neruda

segunda-feira, 5 de março de 2012

Face
ou
História doutra fotografia

Deram-me um panfleto que me pôs a pensar. Tratava-se do anúncio evidente da enorme competência duma mulher no campo da imobiliária. Tinha a fotografia da bicha e tudo. Meio corpo, os braços amarrados um ao outro como se estivesse a proteger-se de investidas dos demais. Contudo, o sorriso destemido, simpático até, desmentia tal aflição.
Pensei fazer uma coisinha do género, eu que sou eficiente e desembaraçada por demais, açambarcadora de clientes, muito embora plena de sabedoria conscienciosa, arrojada na quinta casa a que ainda se junta um toque de simpatia daquela mesmo singular.
Querendo ver a foto, rodar o scroll um pouco. Agradecida, desde já.
Depois, as palavras:
Gina G, uma profissional de renome convida vossa excelência* a visitar o nosso espaço. Entre, observe, vagueie, sinta e respire. Depois compre. Verá que revigora.

*Isto da excelência é um bocado à antiga, bem sei, mas é que aqui o tasco não se pode apartar do vintage, ou clássico, quando não cairá no ridículo, o antigo / antiquário / mausoléu é assim uma espécie de marca da casa.