domingo, 28 de setembro de 2008

Desconcentrada

Perguntaram-me se eu não me lembro do que me dizem, se só conseguia lembrar-me do que penso. Respondi 'se calhar...' a pensar 'sim, é isso!'.
Aprofundei este pensamento e conclui que me lembro do que me dizem mas lembro-me mais e melhor do que já pensei - o muito bom, o bom, o assim-assim, o mau e o muito mau.
Sou muito desconcentrada, tenho uma enorme dificuldade em ouvir prolongadamente alguém, faz-me fernicoques e comichões por todo o corpo, mexo no cabelo... nos olhos e no nariz, quando dou por mim estou concentrada noutro qualquer sítio que não ali a ouvir alguém falar daqueloutro e disto também, desinteressando-me por completo da conversa.
A minha desconcentração deve-se, em parte, à minha vontade de escrever tudo e tudo e tudo. Vivo num mundo só meu porque fui eu que o construí sem dar por isso mas, já que tive trabalho a construí-lo deixo-me lá estar usufruindo da paz e descanso que ele me proporciona e enquanto isso faço uma leitura do mundo que está fora de mim muito individual e própria, pesando tudo e todos. E escrevo todas essas coisas. E estas também.
Não tenho sempre a certeza de que esteja certa, há dias em que me acho totalmente errada e fora da vida real, não fazendo parte de nenhum lugar, nenhum acontecimento, nem de ninguém.
Por tanto ser assim acabo por achar que o meu mundo só existe para mim para depois achar que, no fim de todas as voltas dar às palavras, sou eu que não quero que alguém o veja.

Post para esvaziar a memória

Podia escrever que não me apetece escrever mas isso não é verdade. É por me apetecer escrever que estou a escrever. Só não sei o quê. Estou naquele 'sítio' onde só escrevo parvoíces. Como os post's anteriores, por exemplo.
Às vezes é preciso uma coragem danada pra clicar ali no 'publicar postagem' outras nem por isso.
Tenho uma data de coisas importantes no cantinho da memória e tenho que a esvaziar para que amanhã lá caibam outras. Vou, então, esvaziar a minha memória:

vi de passagem...

a dona Odete... é suficientemente especial para que o seu nome aqui conste - tem um par de mamas tão grande que ela está aqui a falar comigo e as mamas já vão ali à frente no Mercado de Arroios...

o homem... carregado com uma mala a tiracolo que salta ao ritmo do seu andar e, para que se não dobre com o peso da dita, entesa-se todo mas sei que não o alivia porque se lhe carrega a expressão...

o bêbado... não caminha, ondula... parece ele que está em alto-mar no meio de grande tempestade... e está... ou vai estar quando lhe chegar a sobriedade...

a senhora doutora advogada... não sai do escritório sem os seus óculos escuros Vogue, mesmo que chova torrencialmente sempre protege qualquer coisinha... se calhar sofre de foto fobia e eu aqui a dizer mal da mulher…

o dono da imobiliária... quando fala amanda o vozeirão lá tão alto que nem a Fonte Luminosa em pleno funcionamento o abafa... ah…! e também acha sempre que não é assim e eu (ele) é que sei como foi que fiz e que disse…

post sciptum:
é graças à minha mísera profissão que vejo e conheço o que acabei de escrever...
daqui te agradeço, ó profissão, e dedico um minuto da minha vida a não te ser tão aversa...

Constatação

Neste dia vinte e oito de Setembro do ano da graça de dois mil e oito, a falta de jeito para escrever junta-se à já habitual falta de jeito para falar.

Vou ali e venho já.

sábado, 27 de setembro de 2008

'Solitariedade'

Sou solitária, sei que sou. Antes não sabia, pensava que era alegre, simpática e simples mas afinal… não sou. Pensava que era amiga, companheira e leal mas afinal... não sou.
Mas era, isso sim, infeliz e deixei de o ser. Aceitei as minhas ‘coisas’, a minha felicidade está aí.
Sou triste, antipática, complicada e feliz. Não estou mal... vou andando.

Lembrei-me

Eu, que já escrevi aqui zombando de quem pronuncia mal as palavras, desde que escrevo com regularidade, e já lá vão uns anos, apercebi-me da grande tendência que tenho para alguns erros ortográficos. Ora toma lá Gina, que é para não teres a mania que és mais esperta que a outra gente...
E agora, fazendo jus à também grande tendência que tenho para expor as parvoíces que faço, digo e ainda por cima escrevo, acrescento uma lista das palavras que sempre - sempre, sempre, sempre - escrevo mal e que seja bendito o corrector ortográfico deste blog por existir, ainda que seja um corrector parcial pois, entre outras, não aceita os adjectivos no feminino. Não é de todo confiável.
silmuntâneo - esta até a digo mal quanto mais escrevê-la...
«simultâneo»
certeficar - que mal...
«certificar»
exprimentar - aqui esqueço-me do 'e' a seguir ao 'p'...
«experimentar»
telémovel - ponho o acento no segundo 'e', não há nada a fazer...
«telemóvel»
analizar - andei anos convencida que era com 'z'...
«analisar»
Pensando bem... também não são assim tantas. Ele haver mais há mas não as escrevo mal de impulso como estas que referi.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Há pessoas assim...

... Esta semana, na reunião de encarregados de educação na escola da rica filha, quando chegou a altura de eleger o representante dos encarregados de educação, um pai levantou-se do seu lugar imediatamente e despediu-se à pressa desculpando-se à professora que dirigia a reunião alegando que tinha que sair imediatamente pois o tempo de parqueamento esgotara-se.
Treta!!! Aqui em Loures, o parque só é pago até às 18:00h, a reunião começara às 18:15h e estava no fim...
Com o caricato da situação não me contive e fartei-me de rir com a mão à frente da boca para não fazer barulho. Quando passou por mim vi-lhe melhor a cara, estava acabrunhado e vermelho, folguei por estar na fila de trás, apenas a professora por estar de frente para nós e uma ou outra mãe que pelo espanto seguiu o homem com o olhar é que viu como eu me ria à socapa.
É certo que é muito chato para a maioria das pessoas esta nomeação, eu incluída. É preciso tempo e disposição porque as reuniões são uma vez por mês e não é toda a gente que tem essa disponibilidade ou sequer vontade de participar neste género de acontecimento.
Mas, despedir-se à pressa com medo de ser eleito, por cobardia… é tão despropositado que se torna cómico. Eu cá ri-me.
Feliz e heroicamente uma mãe ofereceu-se dispensando assim a votação que forçosamente teria que ser feita para a eleição. Grande mulher.

Compasso ternário

Falo e fica na mesma. Esbracejo e não é bem assim. Condescendo e piora um pouco mais.
Falo. Esbracejo. Condescendo. Ciclicamente. Num compasso ternário qual valsa de Strauss...

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Praxe

A Alameda anda cheia de praxes, hoje lá estavam os estudantes às centenas. Os praxados (ai coitadinhos!) e os praxantes (ai que mauzinhos!).
Alguns, de tanto gritar e brincar ficavam com a garganta seca e iam à pressa beber uma bejeca para logo voltar à brincadeira da praxe. Muita bejeca emborcaram eles...!
Que barulheira a tarde inteira. Até pareciam os meninos ali do colégio infantil aquando dos passeios ao Jardim Zoológico ou ao Aquário Vasco da Gama.
Hummm... não é bem assim. As vozes dos meninos do colégio são dispersas, agudas e estridentes e andam em fila indiana aos pares e de mãozinhas dadas para não se perderem dos monitores que os guiam. Os estudantes, ao contrário, não têm monitor e estão todos ao monte a ver (ou a fazer) a festa, berram frases e cantilenas em uníssono e alguns deles (os coitadinhos) iam adorar perder-se dos restantes (os mauzinhos)... era tão bom.
Continuando - entraram-me dois devidamente fardados pela loja dentro e pediram-me o insecticida Bio Kill. Quando souberam o preço entreolharam-se. Percebi imediatamente que aquilo era para brincar às praxes e referi:
- Se é para brincar é capaz de ser caro.
- Pois, eu vou explicar - respondeu um deles - a gente somos de Química e não gostamos dos gajos de Biologia e isto era para fingir que os matávamos. A piada disto era dizer Bio Kill.
Tive uma ideia que expus imediatamente, eles compravam-me um pulverizador daqueles de pulverizar plantas e escreviam Bio Kill em letras verdes (eu até lhes emprestava a caneta e tudo!) para simular uma verdadeira embalagem de Bio Kill. Eles assim fizeram e lá foram todos contentes brincar às praxes...

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Quase

Ai que já quase me esquecia de contar aqui que hoje ouvi uma senhora dizer-me, depois de eu ter perdido tempo a ler e a explicar uma carta que ela recebera da EDP, assim como que à laia de agradecimento a longo prazo, depois* voltaria lá para me comprar umas coisinhas… não é uma querida?

*Este depois será quando? Aguardo ansiosamente. E também ficarei rica enquanto aguardo, com certeza. Ah…! E já agora sento-me enquanto espero, pois claro.

Despacha-te!

Há a pessoa muito despachada e a pessoa não tão despachada.
Geralmente à pessoa muito despachada faz carradas de impressão a pessoa não tão despachada porque à pessoa muito despachada lhe parece que é ela que tem que tratar de tudo porque a pessoa não tão despachada não se despacha. Mas acontece que a pessoa não tão despachada despacha tudo o que lhe compete e ainda vai despachar o que devia ser a pessoa muito despachada a despachar.
O que se passa com a pessoa não tão despachada é que ela actua em bastidor... e sempre parece ser a pessoa muito despachada que despacha tudo e ainda o faz num ápice deitando por terra todo o despacho da pessoa não tão despachada...

Dona Vitória

Encontrei a dona Vitória por acaso. Não a via há uns dezasseis anos, desde que deixei de trabalhar com ela.
A dona Vitória é alguém que recordo muitas vezes e que sempre quis reencontrar. Encontrei-a por acaso, aconteceu.
Está mais velha mas tem o mesmo sotaque, a mesma inflexão de voz, a mesma alegria. Tem uma data de cabelos brancos e a cor do batom é a mesma - um rosa claro e fluorescente que destoa da sua aparência.
A dona Vitória ensinou-me a costurar, a cozinhar carne assada para fazer croquetes e uns bolinhos enrolados aos quais chamava "charutos" e que alguém lhe ensinara a fazer lá em Angola, entre outras coisas.
Assistiu, também, ao meu casamento e no meio dos preparativos, entre um bordar de pérola e um cortar de tule no meu vestido de noiva, deu-me um conselho tão interessante quanto sábio:
- Gina, quando o teu marido te convidar para sair, nunca digas que não queres ou que não podes. Vai com ele sempre que te pedir, mesmo que não tenhas lavado a louça nem tenhas limpo o pó. Vai. Sai com ele. Nunca digas ao teu marido que não queres sair!
Já há muito tempo que não me lembrava deste conselho tão sábio... foi preciso vê-la para me lembrar.

domingo, 21 de setembro de 2008

Música

Em música de fundo ouvia-se o Camané cantando o fado.
- Creeeeedô! Té parece qi tamo num vêlorio! - disse ela provocando imediatamente um formigueiro no meu estômago.
- É música à portuguesa... - respondi eu de sorriso amarelo.
- Ah eu adooooro múseca porrrtuguesa! - pôs a mão no peito para dar ênfase à exclamação - máis naum sei... essa múseca naum cumbina cumigo...
- Por isso é que eu disse que é música à portuguesa... - aqui o meu sorriso ainda não mudara o tom.
- Noooossa! Parece que vaum morrê dji amô!
Entretanto senti o meu sorriso mudar de tonalidade, passou pelo laranja doce e foi até ao escarlate apaixonado por causa de uma brilhante resposta que me apareceu na pontinha da língua e que retorqui imediatamente:
- Então... mas vocês lá no Brasil também têm música assim para o paradinho...
- Ah pois é, né? Temo á múseca sertaneeeija! Tamém fala sssim dji amô, dji tráiçaum...!
- Parece que vão todos morrer de amor... - lembrei eu, triunfante. Trouxe a taça para casa e tudo... está ali em cima do móvel na sala em grande destaque.

Há dias em que já não posso mais... que vontade de os mandar à merda! Se não presta que vêm todos cá fazer? Bolas...!

Lindo dia!

Tenho uma folha em branco à minha espera. Posso escrever que hoje está um lindo dia, nem calor nem frio demais e o sol vai espreitando por entre as nuvens sempre que lhe apetece. Posso escrever que não me apetece escrever, não é bem bem que não me apeteça, é mesmo falta de assunto para escrever...

sábado, 20 de setembro de 2008

Reescrever é preciso

Tenho andado a pensar neste post porque entretanto reparei que não soube transpor para o texto o pequeno episódio que vivi, resumi tanto que fugi um pouco do assunto, não revelando bem a peculiaridade da situação. De certa forma vou reescrevê-lo:

Enquanto esperava a chamada ia-me distraindo com o ambiente da sala de espera.
Sentada ao balcão lá no fundo, a recepcionista questionava os utentes que iam chegando para assim preencher quadradinhos com dados no computador. Mais perto de onde me encontrava duas senhoras folheavam revistas antiquíssimas não demonstrando qualquer interesse no que viam nelas.
Lá de dentro veio um homem de bata branca esvoaçante por ter apenas dois botões apertados. Olhou imediatamente para mim, interessado. Tinha um olhar lindíssimo – claro e muito brilhante. No olhar vi-lhe também muitas outras coisas. Desviou-o quando chamou:
- Dona Maria Antónia e dona Irene da Conceição!
As duas senhoras que olhavam para as revistas levantaram-se imediatamente e foram ter com ele. Não era ainda a minha vez, deixei-me estar sentada e não desviei a atenção da presença dele. Entretanto pensei que tinha ali um doutorzinho irónico e malicioso, se era aquele que me ia calhar logo se veria.
Passados instantes ele apareceu outra vez e chamou pelo meu nome, olhava para mim com aquele olhar magnífico e cheio de muitas coisas. Encarei-o e enquanto me dirigia até ele sorri e sustentei-lhe o olhar que não desistia da ironia nem da malícia.
Lá dentro, no tal cubículo, deu-me as instruções para me fazer o raio-X adoptando uma postura profissional mas deixando uma fresta por onde saia qualquer coisa de sensual e místico.
Estou numa idade, ou numa fase da vida, em que este tipo de situação já não me apavora, até acho piada e actuo com naturalidade.
Talvez actue com naturalidade porque tenho um casamento sólido e feliz e não vai ser um belo par de olhos verdes e vorazes que me vai mandar dum abismo abaixo estragando toda a minha felicidade por causa duma queca furtiva. Existe uma facilidade tão grande para quecas furtivas que, de alguma maneira, já atingiu a normalidade perante a maioria das pessoas.
Eu, por mim, já que não me interessa tais vivências, mais não fiz do que dissecar o que vi de modo a desvalorizar a “qualquer coisa de sensual e místico”.

Saí dali já preparada e enfiei-me no sítio que, achava eu, era a saída... mas não era. O mestre lá daquela coisa sai (ou entra, nem sei...) de uma daquelas portas que acho que já foram brancas e com o olhar brilhante de gozo disse-me:
- Para sair...? Experimente por este lado...
Não, não foi no chão que me enfiei. Foi mesmo no sítio que ele sugeriu...

Este pedaço de texto em itálico que copiei tem agora um significado diferente, não tem?

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Continuando do anterior post...

... ainda bem que há a tal diferença. O rico filho, por já ter catorze anos e ter muito mais força que eu, é perfeitamente capaz de levantar o micro-ondas e aguentá-lo nos braços enquanto eu limpo lá debaixo, ou tirar qualquer coisa que esteja lá no alto dos armários evitando assim que eu tenha que ir buscar um escadote... (mas era escusado perder o cartão da escola, claro!)

Um espaço de tempo

Entre o ano dois mil e este em que estamos existe uma diferença (possivelmente) básica:

- Quando entrou para o primeiro ano, no primeiro dia de aulas, o rico filho trazia na mochila da escola um papel onde constava a lista do material. Mostrou-ma assim que me viu para irmos logo comprar a correr...

- As aulas começaram na segunda-feira e a meio desta primeira semana o rico filho já perdeu algo imprescindível, o cartão da escola...

Bem que o Camões tinha razão - "mudam-se os tempos e as vontades".

Nota: no ano 2000 o André tinha 6 anos, hoje tem 14... mas a diferença não é apenas essa.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Coscuvilhice

O senhor Francisco (o meu merceeiro) contou-me este pequeno episódio em surdina e mais elaboradamente. Ao escrever, eu fiz uma síntese:

Sabe, menina Gina, sabe que esta anda aqui a atacar? Palavra que sim! Se eu não tivesse visto com os meus próprios olhos não acreditava! Houve um dia em que a vi atravessar esta passadeira... e quando dei por ela estava ali a cutucar um senhor que estava na cabine telefónica e qual não é o meu espanto quando a vejo vir para cá de braço dado com ele e entrarem os dois ali no número trinta e oito...!

É sabido que o que a malta gosta é de algo que cause espanto. Em se falando de prostituição então… é de abanar a barraca! Não fugindo ao geral, eu própria me espantei com o relato do senhor Francisco...
Estas coisas são sempre contadas entre a incredulidade por tamanha indecência do acto e a vontade de experimentar o que tão ilícito acham.
Isto são tudo coisinhas tão escondidinhas lá no fundo que o senhor Francisco certamente nem dá por elas. Mas eu dou…

Que indecência!

- Boa tarde. Eu quero a FHM, por favor.
A mulher olhou para mim como se visse bicho raro e peçonhento. Eu, ao pedir uma revista desta categoria, sou imediatamente confundida com uma leprosa ou isso. Apressada, aviou-me o que lhe pedira e eu fiquei a pensar se estaria escrito na minha testa qualquer coisita denunciante de comportamentos impróprios.
Sim, eu acho que as revistas feitas a pensar nos homens são muito mais interessantes que as pensadas para as mulheres... isso aos olhos de algumas pessoas é indecente e lá na cabecinha delas já me estão a chamar cá uns nomes...!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Raio-X

Fui fazer um raio-X. Preparei-me num espaço minúsculo (um metro quadrado, para aí) e saí desse cubículo para a sala enorme mas só em altura, onde tirei a 'foto' sempre sob as ordens do mestre lá daquela coisa. Para me distrair ia olhando pela janela para ver o movimento da avenida. É claro que devo ter ficado giríssima mas isso para o caso não interessa mesmo nada...
Quando aquilo acabou, voltei a entrar no 'metro quadrado' e tornei a preparar-me mas desta vez de maneira diferente - diga-se mais composta.
Saí dali já preparada e enfiei-me no sítio que, achava eu, era a saída... mas não era. O mestre lá daquela coisa sai (ou entra, nem sei...) de uma daquelas portas que acho que já foram brancas e com o olhar brilhante de gozo disse-me:
- Para sair...? Experimente por este lado...
Não, não foi no chão que me enfiei. Foi mesmo no sítio que ele sugeriu...

Tenho que me deixar destas coisas...

- Quero uma lâmpada destas, por favor.
- Uma chega?

Pois então não chegará! Se o homem pediu uma (uma!) lâmpada porque raio é que eu tenho que perguntar logo de rajada se chega ou não?

Ah...

... assim de repente lembrei-me que hoje uma senhora disse-me que ia ao Cinema Império, no tempo em que era o Cinema Império pois claro, porque era o único cinema onde o marido a deixava ir por ser mesmo ali ao lado.

Espanto... muito espanto... Parece-me que ainda não ouvi tudo na minha vida. Ai não ouvi, não. Mas ainda existem pessoas assim? É o que parece. Ou se calhar não...

Pergunta do dia

É em dias como este que me pergunto se valerá a pena porque é em dias como este que sinto não valer a pena.
Esforço-me por melhorar, a sério que sim, mas nada há que melhore porque nada há para melhorar. É essa a minha realidade, hoje.
A multidão deu de vaia e abalou. Sacudi a cabeça e caíram papelinhos de entre os fios dos meus cabelos que ficaram espalhados pelo chão. Lembrei-me da festa de ontem. Respirei fundo. Acabou a festa. O sentimento reapareceu. Agarrei na vassoura e varri o chão. A rainha deste lugar varre, também, o chão.
Não, o sentimento não é humilhante, não estou aquém de nada nem de ninguém por isso mas a minha realidade é essa, hoje. Eu reino mas varro o chão. E em dias como este eu sinto que o esforço não vale a pena.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Saudação

O tapete vermelho aguarda solenemente a minha passagem - piso-o sem piedade. Ouve-se um som de fundo… é a multidão berrando extasiada, rendida à aparição da minha figura. Radiante, acolho os cumprimentos do povo entusiasmado, entre um aceno e outro distribuo sorrisos e sopro beijinhos às criancinhas e aos jovens que me aplaudem regozijando-se na fausta e ilustre presença da minha pessoa. É dia de festa!!! De entre aquele oceano de rostos e lenços brancos emergem prontas exclamações:

"Salvé, rainha deste lugar!";
"Que seja bem-vinda a balconista mais simpática desta nação!";
"Agraciada és pela honra de ocupares este espaço!";
"Como é bom ter-te de volta a estas paragens!";
"Tem um paciente e descansado regresso, ó nossa mestra e senhora!";
"Bem-aventurada sejas!"

Abri a porta, desliguei o alarme, liguei o computador. Seguindo os meus gestos o povo aplaudia-me numa ovação estridente… mas é dia de festa e não há nada melhor do que um bom e sentido acolhimento!

Regressei ao trabalho, que alegria!!!

Post scriptum (para que conste):
Houve bolo, houve sim senhor: metade de um pão de deus. A bebida? Um café em duas chávenas…

domingo, 14 de setembro de 2008

Verde Água

Como hoje é um daqueles dias que não sei que escrever andei por aí e fui parar ao meu primeiro blog. Relembrei os meus primeiros tempos de blogger, de como ficava embaraçada com a ideia de que alguém lia aquilo, da busca de companhia nas palavras, a minha busca nas minhas próprias palavras.

Num dos blog´s que li hoje mas do qual não me lembro o nome (sei que é imperdoável mas peço desculpa à mesma) estava a seguinte frase: se você se sente só é porque construiu muros à sua volta em vez de pontes.
Fiquei a pensar naquilo. A solidão que sinto é única e exclusivamente culpa minha. Não sei cativar as pessoas de maneira que elas gostem de vir à minha casa, desfrutar da minha comida e da minha companhia. Relaciono-me com as pessoas mas é porque sou obrigada a isso, não é possível viver completamente isolada. Quando aparecem oportunidades de fazer amizades mais sólidas ou mais íntimas eu encolho-me, tenho medo de me dar às pessoas. E assim, acabo por afastar as pessoas da minha vida. Isto porque tenho o péssimo defeito de levar tudo a mal, o que me dizem ou fazem. Travo uma luta quase constante contra este meu defeito... Acabo sempre por achar que as pessoas não gostam de mim o suficiente, então, tento não lhes dar importância e vou ficando cada vez mais fechada no meu casulo.
Já há muito tempo que eu me apercebi destas coisas que estou aqui a escrever agora e também sei que devia mudar. Só que quanto mais tempo passa mais difícil é mudar o meu comportamento. Sinto-me mal por me sentir só porque eu tenho tudo o que se possa desejar, tudo mesmo. Não me falta carinho, amor, saúde, casa, comida, conforto, enfim... eu tenho tudo, então porquê esta insatisfação?

(20 de Maio de 2006)

Quando releio qualquer coisa que já tenha escrito há muito tempo costumo sentir um certo desprendimento daquilo que senti e que me levou a escrever, às vezes até custo a crer que tenha sido eu a escrever o que estou a ler.
No entanto, neste excerto de texto não me sinto de todo deslocada com o que vivo hoje em termos de sentimento, ainda me sinto um pouco assim. Hoje tenho amigos reais e dou-me com pessoas da minha idade, saio e divirto-me com elas. Aqui, no virtual, também tenho amigos, aos poucos as pessoas foram aparecendo, umas de fugida outras porque gostam... mas vão aparecendo e agrada-me muitíssimo a companhia dos leitores.
Nunca fui muito comentada ou visitada e se calhar é por isso que sempre dei muito valor aos comentários. Hoje sei que escrevo para emitir o que quero que seja "ouvido". Se houver retorno, se houver resposta de alguém, é óbvio que terei a certeza que estou a ser lida. E eu gosto disso. É por isso que publico textos, publico-os porque gosto de ser "ouvida".
Mas, lá no fundo, esta solidão, este desacompanhamento que sinto por ser pouco lida, dá-me jeito. Inicialmente, se assim não fosse, rapidamente me sentiria inibida em publicar textos que exprimissem certas ideias e o facto de nunca andar por aqui muita de gente acabou por me dar coragem e uma grande abertura de mente, foi assim que a musa apareceu cada vez mais amiúde. Depois das dúvidas chegaram as certezas - se ninguém lia, paciência...
A seguir, comecei a ter certezas sem passar pelas dúvidas- eu quero escrever acerca disto ou daquilo "ainda bem que ninguém lê", pensava eu. Aprendi que não posso criticar o que escrevo, não posso ter medo do que vão pensar, não posso sequer esperar que leiam sem, no entanto, deixar de lado a ideia de que para nada servem as histórias se ninguém as ler...
Mas... eu comparo muito o impacto que o meu blog provoca na blogosfera à minha própria vida. O meu blog é um espelho de mim, da minha personalidade, e aquele excerto de texto fala de como afasto as pessoas porque não sei mantê-las, aqui acontece o mesmo. É raro haver alguém que cá fique. A culpa não é dos leitores, é minha...:

os textos são longos...
os temas são pessoais...
a escrita surge intimista...
e torna-se insignificante...

Verificação

O post anterior parece ter sido escrito depois de ler isto... mas não foi! Neste livro encontrei duas frases que parecem esbarrar de frente como que lá escrevi.

"Não existe nada mais saudável para a saúde psíquica que outras pessoas - mesmo Robinson Crusoé precisava de Sexta-feira. Um mundo sem outras pessoas seria estéril e incaracterístico."

sábado, 13 de setembro de 2008

Verdade amarga

Tenho sempre uma gigantesca (talvez astronómica) dificuldade em saber que hei-de fazer. O meu barquinho pequenino sem vela nem rumo ondula à deriva, entre uma ideia, um pensamento e um querer. Perdida, vou-me deixando ondular.
Às vezes as pessoas não sabem como me dizer o que querem dizer, de que modo se hão-de dirigir a mim, eu sei. E sei que sou eu que as levo até aí.
Descobri que sou anti-social, essa é a verdade. Amarga, por sinal. Gosto tanto de pessoas como de estar sozinha no meu barquinho pequenino. Gosto de assistir a episódios giros com pessoas interessantes e depois escrevê-los - eu gosto das pessoas e de estar com elas. Sem elas eu não teria histórias. Mas gosto de estar sozinha, de pensar sozinha, de passear sozinha, de admirar sozinha. Talvez isto não fosse uma contradição se os dias tivessem mais horas. Aí, eu teria tempo para estar com as pessoas e para estar sozinha a escrever o que quero.
É esta impossibilidade que torna aquela verdade tão amarga.
"a velhota... daquelas que tem um casaquinho vermelho com botões dourados em malha canelada e que foi a grande moda para aí a meio da década passada mas não faz mal porque já está um friozinho do caraças e para o enfrentar não interessa para nada o que acabei de escrever..."

- Achas que este texto é meu?
- Acho. Tem o teu cunho.
- Mas não é - menti só para ver o que dava.
- Não? Mas parece...
- É meu, é. Eu queria era saber se dava para perceber...
Segundo o meu amor a minha escrita é irónica, divertida e contraditória pois consigo no mesmo texto dar e retirar importância às coisas. Este modo de escrever poderá não dar que pensar mas desperta reacções e sentimentos e isso é o mais importante num escritor.

Foi ele que disse. E eu escrevi porque me dá grande prazer saber estas coisas e se as escrever já não esqueço.

Desejo

Há uma pessoa, que nem sequer faz ideia que mantenho um blog pois nunca lhe disse, que eu desejo muito que um dia leia todas as palavras que compõem este espaço - o meu pai.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

«Não sou escritor, a não ser quando escrevo.» Juan Carlos Onetti

Vi uma daquelas feiras do livro que existem nas estações de Metro. Não resisti. Entrei. Gosto muito de livros e de lhes tocar, um pouco como se fosse uma criança.
Dei uma voltinha por ali e folheei alguns. Houve um que me chamou a atenção - "Como escrever um romance e conseguir publicá-lo" de Nigel Watts.
Habitualmente não me interesso minimamente por livros que sejam como um manual de instruções mas este achei-o logo diferente pela apresentação do assunto ser muito directa e simples.
Eu sempre quis escrever uma história inventada e se calhar essa ideia pesou no interesse pelo livro e como, assim que li algumas linhas, me apercebi de que não existem regras para se escrever o que quer que seja e na verdade o autor apenas redige ideias que poderão funcionar para desenvolver e levar a cabo um romance mas não ensina como o fazer por tal ser impossível de transmitir. Escrever um romance é uma forma de arte e não há como ensinar alguém a ser artista, para além de que, e esta eu também já sabia, a criação é um acto solitário - ninguém poderá ajudar.
Para já, aprendi que existem três regras para escrever um romance e que, infelizmente, ninguém sabe que três regras são essas. Mas que existe, isso sim, um único requisito para se ser escritor - humanidade.
E depois... li algo neste livro que eu já sabia ser assim: o prazer da escrita está na liberdade em relação aos constrangimentos.
Nunca iniciei a verdadeira actividade de escrever um romance porque estou demasiado habituada a escrever acerca do que realmente vejo, vivo e sinto. Custa-me horrores pensar por outras cabeças, sentir outros sentires, inventar.
Se calhar o livro ajuda...

Daqui não passarás

... sempre existirão lugares onde te respiro... nos bancos do jardim... na balaustrada junto ao Tejo... nos acordes de uma canção... na praia do Carvalhal... na estrada comprida e silenciosa... na calçada íngreme ... no restaurante cor-de-laranja... no meu repouso...
deixa-te estar... gosto de te saber aí...
outra vez uma viagem de metropolitano... três vezes na mesma semana não é nada comum, principalmente estando de férias mas lá fui eu... e vi de passagem:

o jovem... rebusca rapidamente no bolso das calças xxl que traz vestidas procurando o telemóvel que o chama perdida e convulsivamente... como se fosse um cão a ganir pedindo festinhas...

a velhota... daquelas que tem um casaquinho vermelho com botões dourados em malha canelada e que foi a grande moda para aí a meio da década passada mas não faz mal porque já está um friozinho do caraças e para o enfrentar não interessa para nada o que acabei de escrever...

o gay... sim, é mesmo gay porque é doutor, se fosse ladrilhador ou bate-chapa ou camionista ou isso era paneleiro, quando o vi estava fortemente intencionado em não tocar com a pasta que trazia consigo em coisa alguma ou em alguém, de cada vez que tal acontecia fazia trejeitos com a boca revelando enfado, talvez nojo, em que a pasta (pois, pois... a pasta) tocasse em alguém... 'tava a ver que o homem (!!!) ia vomitar ali... tal era a náusea que parecia sentir...

a dupla de amigos... conversam animadamente acerca de uma entrevista que passou ontem à noite na TV, estão sentados num banco de três lugares sobrando, pois claro, um dos lugares... sento-me lá, naquele lugarzinho pequenino toda encolhidinha e coiso... e maldigo-me a mim mesma por passar tantos minutos da minha vida com a mania que tenho certas partes do corpo assim como que para o grande... se esse pensamento fosse verdadeiro eu não caberia ali...

a menina... dezasseis aninhos, para aí... alta, esguia, linda, loura e... pele cor de solário mas... mesmo assim continua alta, esguia, linda, loura e... só mesmo eu para reparar na artificialidade da cor da pele da rapariga... para que é que isso interessa...? o resto é que é interessante...

o homem... assim que se ouve o toque do telemóvel do jovem já apresentado neste post mete a mão à boca para abafar o riso mas o sacudir de ombros denuncia-o e eu sinto que o melhor é não olhar mais para ele a ver se consigo não me rir eu também com tão insólito som...
Quando tenho muito tempo para andar por aí vagueando pela blogosfera e para pensar (que é o caso pois estou de férias e está tudo feitinho, inclusive a sobremesa para o jantar), deparo-me com blog's de todas as cores e feitios, obviamente.
Quando me deparo com aqueles que têm muitos comentários sinto-me acanhada e não comento. Não é que por lá estar alguém que me veja mas sinto-me sem nada para dizer por me parecer que já todos disseram tudo e também me sinto uma intrusa.
E depois há aqueles que têm pouca gente e tal e lá deixo um comentário ou outro e sempre que deixo um comentário, é porque acho mesmo que tenho algo a dizer.
Quando é um primeiro comentário, é comum o autor vir retribuir a visita e deixar umas palavritas em jeito de agradecimento e até há os que deixam umas palavritas de apreciação à minha maneira de escrever.
Até aqui tudo bem, não é verdade? Mas... e depois? Depois... na maioria das vezes não voltam mais. E, quando eu tenho tempo para pensar nestas merdas (que é o caso pois estou de férias e até já tenho tudo feitinho, inclusive a sobremesa para o jantar), começa a invadir-me e a crescer assombrosamente aquela minha estúpida ideia de que não sei cativar pessoas, não sei retê-las, elas não ficam cá, não se prendem... tal como na minha vida. O meu blog é igual à minha vida porque escrevo como penso e como sou. Claro! Nem poderia dar noutra coisa e sinto-me mais estúpida ainda... devia aproveitar este espaço para criar algo novo. Mas não... eu não sou capaz de inventar porra nenhuma! Eu sou assim e é assim que este blog vai continuar...



E agora convém agradecer (em letras maiores para ter mais destaque que o desabafo que acabaste de ler, espero) às pessoas que tão assiduamente lêem o meu blog e a outras que não o lêem tanto assim mas é por falta de tempo, eu sei... desculpa lá qualquer coisinha ó leitor/a assíduo/a mas é que eu estou de férias, tenho tempo à brava para pensar em merdas que não valem um cú e tenho tudo feitinho, inclusive a sobremesa para o jantar...

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Escrevi o post anterior porque sim. Escrevi porque costumo escrever o que me vai na alma. Escrevi porque gosto de saber que retenho, nem que seja por segundos, a atenção de alguém e para que ficasse registado que um médico me achou piada por ser diferente.
Mas não foi só. Escrevi para partilhar um acontecimento importante para mim mas logo a seguir senti algum arrependimento. Não tenho o mínimo jeito para me queixar, só ao meu amor me queixo e mesmo assim nem sempre. Sem querer fiz parecer que não era a cirurgia o ponto alto do post e continuo a fazer isso neste post...
Não tenho medo mas estou preocupada. E sei que com o decorrer de tempo que falta a preocupação vai dar lugar ao medo. Eu não tenho medo de dizer que tenho medo nem tenho medo do medo. Eu sei que o medo vem aí.

No consultório

- Então, o que a traz por cá?
Resumidamente expliquei o motivo, mostrei os exames.
- O que faz?
Ia responder balconista mas lembrei-me disto. Cá por dentro sorri e respondi:
- Sou empregada de balcão.
- Onde?
Achei a pergunta um tudo nada estranha e despropositada e supus que o que ele queria era perguntar em que tipo de loja.
- Numa drogaria.
- Numa drogaria? - fez uma pequena pausa - Qual é o melhor remédio para as formigas? Tenho lá em casa uma praga, pá...!
Arregalei os olhos, acho. Seguidamente tivemos uma pequena conversa acerca de como aniquilar bichinhos que até são de andar por casa mas apesar disso não são bem-vindos no lar que teimam em habitar. E eu descontraí, se calhar era o que ele queria...
- Então, diga-me lá: quer ser operada?
Respondi que sim, que se era o melhor para que desaparecessem os sintomas que tenho sentido nos últimos meses, fôssemos a "isso". Desembaraçado, respondeu-me:
- Minha querida, não há outra solução!
- Seja! - disse eu, tão desembaraçadamente como ele.
Depois foi um reboliço, na minha cabeça passavam rapidamente as vantagens e as desvantagens do que vai acontecer. Estava à minha frente um médico empenhado em me encaixar na sua agenda de cirurgias. Percebi que estava cansado, suspirava entre um olhar para o calendário para situar a quantidade de feriados que aí vêm e um fechar e abrir de várias agendas pois trabalha em vários hospitais e há que coordenar as coisas muito bem para que nada falhe.
Olhei para ele com um misto de admiração e curiosidade em grandes porções e uma pequena dose dos opostos amor e ódio - aquele é o homem com quem me vou estrear em matéria de cirurgia. De repente:
- É o senhor que me vai cortar?
Ele levantou o olhar dos papéis, um olhar sério e atónito.
- Sim... sou eu que a vou operar, o cirurgião sou eu.
Sustentei o olhar dele, absorvida pela curiosidade mas ele pensou que eu estava com medo pois disse muito depressa:
- Mas não se preocupe que eu já fiz mais de dezassete mil operações destas!
- Nunca ninguém morreu? - continuei eu sorridente e provocadora.
- Já... já morreram vários... mas não me pergunte porquê, morreram porque sim...!
- Claro, eu sei que os médicos não têm solução para tudo - continuei a olhar para ele.
Foi a vez dele ficar curioso:
- Vem de onde, de que Centro de Saúde?
- De Loures.
- Ah... é que hoje apareceram-me para aí uma data de doentes de outro sítio, você vem de Loures... - fez um gesto largo indicando que "a data de doentes de outro sítio" tinham sido difíceis de aturar e que eu não fazia parte desse grupo de chatos.

Que alegria, eu sou diferente... (sorriso)
Comunicado (ou conversa entrecortada, talvez)

- ...
- Eia pá...! Oh que chatice...!
- ...
- Pois é... um gajo esforça-se, faz o que pode mas é assim... olha...
- ...
- Um gajo dá o que tem e o que não tem e depois acontecem estas coisas...
-...
- Pronto, pá! Coragem... agora tens que levar a tua vida para a frente... olha...
- ...
- Pois é, pá! Elas não matam mas moem...
- ...
- Se precisares de alguma coisa já sabes, 'tá?
- ...
- Nada, deixa lá isso, atão?... a gente 'tá cá...
- ...
- Xau aí. Força.
- ...

Mesmo só escutando uma das partes foi muito fácil perceber que:

primeiro:
havia um casamento desfeito...

segundo:
o gajo estava desfeito em lamentos...

terceiro:
ela é que é má e perversa (leia-se puta) mas não se fez ouvir...

quarto:
ele é um coitadinho daqueles que tudo faz para agradar à mulherzinha querida, pobrezinho dele que ainda vai ficar sem nada e não vai ter onde cair nem vivo nem ferido nem morto, tudo por causa daquela grande filha de uma enorme égua!... (leia-se puta outra vez, claro!)

Conclusão: elas são sempre a desgraça deles.
Queixei-me do frio.
- Brrrrrr!...
- Oh... tem problemas com os ossos?
- Não... o meu problema é mesmo com o frio...

Mas afinal, de que resposta é que ela estava à espera?

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Eu e um mar de gente

Hoje de manhã viajei de Metro. Estou desabituada de gente, de imensidão humana, de bafes e cheiros alheios. Fez-me muita confusão, parece eu que não sei o que é andar de Metro...
Deixei ir embora o primeiro comboio. Não precisava de me fundir naquela multidão, tinha tempo.
Já na carruagem, três turistas holandesas sexagenárias (creio) falavam entre si chamando a minha atenção. Uma delas sorria-me constantemente e eu retribuía o sorriso. É engraçado que quando não se fala a mesma língua o sorriso impera e é um bem mais valioso ainda.
Uma voz soa no altifalante - Baixa-Chiado aproxima-se, estou quase lá. Levanto-me e dirijo-me à saída. As pessoas remexem-se, encolhem-se. O comboio pára. À minha frente está uma senhora que observo do "alto" do meu metro e cinquenta e cinco. É tão pequenina que lhe vejo o alto da cabeça, tem o cabelo louro pintado e todo espetadinho transmitindo assim irreverência, como se não quisesse deixar morrer a adolescência que já se foi há décadas. Enverga um conjunto calça e casaco de cor clara, num estilo jovial mas sóbrio. O típico e clássico de quem quer continuar a parecer jovem sem chocar - apostou apenas no penteado e deixou o resto na timidez e na transparência, como que para ter uma imagem algo apagada mas pontilhada com uma cabeleira colorida e moderna. Mal sabe ela que eu passo a minha vida a tentar ver na escuridão e a perceber o que escapa aos outros. Mas ainda bem que não sabe.
O comboio abriu alas. A senhora pequenina fez gestos de quem ia sair mas o salto da sandália prendeu-se num dos frisos onde correm as portas do comboio e ela pousou um pé descalço no chão da estação.
- Merda! - exclama ela. Exclamação essa levada ao rubro pelo embaraço, eu vi quando ela se voltou para trás para enfiar de novo a sandália no pé.
Ora... lá se foi a sobriedade... a transparência... escrevo eu.

(In)segurança

Ontem à noite, por volta das dez, lembrei-me da tão ultimamente falada (in)segurança.
Viajava de carro completamente sozinha e parei num sinal vermelho na Avenida Almirante Reis, esquina com a Rua dos Anjos. Olhei em redor - lojas fechadas, luzes apagadas, ninguém. Se não havia ninguém na rua porque controlei um medo que apareceu sem o ter chamado? Porque fechei o vidro?
Arranquei. Mais à frente parei num sinal vermelho na Rua dos Fanqueiros, esquina com a Rua da Conceição. As condições eram as mesmas - ausência total de pessoas, de movimento, só mudava o cenário, esta rua é muito mais estreita.
Senti-me tola e enclausurada. "Gina Maria, deixa-te de merdas e abre a porra do vidro!" pensei eu e assim fiz. Senti-me aliviada. Cheguei ao meu destino intacta.. e vitoriosa. Tinha vencido o meu medo.
O teu IP é o 257455476845347!
O teu fornecedor é Telepac - Comunicações Interactivas SA!
Estás a usar o Windows XP e a usar o IE7!

Às vezes dou com isto no final da página de alguns blog's que visito.Isto servirá para quê? Cuidarão que não sei o que tenho cá em casa? Que preciso que me notifiquem acerca daquilo que eu própria possuo? Ou será para me seguirem o rasto?

Agora a sério: alguém me explica para que serve? Se é útil para alguma coisa, se é só porque é giro ou só porque sim...

Ainda a propósito do meu modo de escrever

Quando pensei que deveria escrever algumas palavras ali no meu perfil, fiz um rascunho à mão. Nas alturas em que quero escrever algo conciso e específico, tenho que escrever no papel, assim sai melhor...
E foi num papel que escrevi o que se lê no perfil. O Luís viu o rascunho aqui em cima da secretária e, sem eu ver, escreveu por baixo:

"e nóias*... para dar e vender... mas sem nóias, defeitos, qualidades, tu... não serias tu..."

*paranóias

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

(o que não deixa de ser) Uma comparação

Li algures num jornal qualquer alguém dizer que sempre escreveu compulsivamente.
Eu não. Eu não escrevo compulsivamente. Quando muito escrevo desenfreadamente mas isso não é marcante em mim. Nos quase seiscentos post's que escrevi até hoje nem à meia dúzia deve chegar o número de post's que escrevi assim, desenfreadamente.
Mas penso compulsivamente. Isso sim. E guardo tudo num cantinho da minha memória, que criei propositadamente para tal e, assim que posso, transformo em texto.
E depois, a escrever, o texto é escrito a fogo lento. As palavras até podem aparecer na minha cabeça amontoadas e sem sentido mas não saem em catadupa, vão daí até ao ecrã lentamente, pouso o olhar no que vai aparecendo e demoro-me lá... lendo e compondo, lendo e compondo...
É assim que ordeno e construo um texto... tiro horas aos meus dias só porque gosto de escrever. Isso tem um certo quê de injusto mas eu não me posso importar. Tudo na minha vida é executado sem vontade e em prol dos outros. Tudo menos isto. Isto é só meu.
Tenho uma necessidade permanente de criar algo escrevendo e é por isso que mesmo depois de esgotadas as palavras e as ideias, quando já não vejo nada senão as coisas más, quando o melhor que tenho a fazer é fechar os olhos, esquecer e nem escrever para não pensar mais, quem sabe até fechar o blog... eis que me aparece uma ideia nova! Tem-me acontecido sempre, sempre, sempre assim.
Por isso é que ainda me mantenho por aqui apesar da cabeça vazia de tantas coisas, porque isto... é meu.

Voltei a ficar sozinha. Agora tenho um tipo de liberdade que há já algum tempo não tinha - tanto posso ir ali como acolá e também posso ficar aqui. Há um espaço de tempo em que posso decidir sozinha para onde vou e o que faço.
O mau - continuo a não saber estar com as pessoas. Ou o pior - são as pessoas que não querem estar comigo por eu ser inacessível.
Prefiro acreditar na primeira frase do parágrafo acima. Dói menos. A dor que há na frase a seguir é insuportável e torna-me mais solitária ainda.

domingo, 7 de setembro de 2008

O sentido da vida

Eu, por mim, em cada vez que tento pesquisar dentro de mim, e há vezes em que até procuro do lado de fora de mim, chego sempre ao ponto inicial. Parece-me sempre que o sentido da vida é indescritível senão mesmo indecifrável. Isto porque existem tantos sentidos de vida quantos são os seres humanos. Não haverá, portanto, um único sentido da vida.
Sempre que procuro as respostas que até hoje não encontrei, vejo-me andando em cima de uma esfera, em que por mais que ande nunca hei-de chegar ao fim, ou, quando muito, chego ao ponto de partida sem nada ter encontrado. E quando isso acontece escrevo coisas deste género:

Na busca incessante da minha verdade, invento que quero dedicar-me às coisas que nunca saberei sentir nem sequer escrever. Fantasio mentiras até parecerem verdades. Não obstante, aqui continuarei.

Ou deste:

Faço uma ronda, passeio por mim e chego sempre ao ponto de partida. Esburaco-me e rebusco cá dentro para me entender. Ordeno tudo e saio dali mas volto ao que sentia no início - desordem e torpor.

Se calhar, o sentido da vida está na simplificação das coisas, está em não fazer esforço algum, quer para saber que ando cá a fazer, quer para achar o significado das coisas que sinto.
Caí neste mundo sem ter havido sequer opção, sem nada escolher - o sexo, a cor, a família que me acolheu ou o lugar de aterragem - e deveria aproveitar o que tenho sem reservas de espécie alguma para não desperdiçar o tão precioso tempo que, em cada segundo que passa, é mais raro por restar cada vez menos.
Por outro lado, creio ser necessário, até imprescindível, que não se perca muito tempo não querendo perder tempo pois isso dá largas à insatisfação, acharei tudo desmesuradamente importante e facilmente me frustrarei. Sempre devo usar de senso.
Mas, quando for, fica cá qualquer coisa, todos deixamos um legado. A prole é o maior legado mas mesmo os que não germinaram, mesmo os que não deixam um nome, deixam um legado. Deixam obras, actos, sentimentos que se perpetuarão na memória de quem conheceram... que podem ser bons ou não, depende. Mas deixam. Já escrevi sobre isso uma vez:

Morreu alguém de seu nome Margarida. Não tenho muitas recordações dela mas provavelmente não a esquecerei. Por entre bolos que sabiam a naftalina e o costume de pôr um pratinho na mesa para tudo, a Tia Margarida vai ser recordada.
Esta tarde ocorreu o seu funeral. Foi uma cerimónia tão triste quanto bonita. Várias pessoas subiram ao púlpito para falar acerca da crente que partira para o Céu. É nisso que acreditam. Quando se pratica uma vida espiritual é natural que a congregação tenha palavras de conhecimento e reconhecimento daquilo que a pessoa foi e do seu trabalho na Igreja.

E outra vez:

Ao folhear os álbuns relembrei e contei várias histórias de familiares. E também lembrei pessoas que já morreram, as que já tinham morrido naquela data e as que já morreram depois disso. Infelizmente já são várias...
Depois disso, inevitavelmente, fiquei nostálgica. Lembrei-me do meu primo que morreu quando eu tinha 15 anos e ele 18. A morte dele custou-me muito, era o meu primo preferido, tinha-lhe uma amizade tão grande e tão profunda que mais parecia paixão, embora eu não sentisse absolutamente nada de físico em relação a ele, era um amor platónico.
O António era um excelente rapaz, muito meigo e calmo. Tinha montes de paciência para mim e para as minhas infantilidades. Conversávamos imenso sobre tudo e mais alguma coisa, nunca me dizia que não lhe apetecia brincar ou falar comigo. Eu ficava deliciada com a atenção que ele me dedicava, era muito diferente do meu irmão que não tinha grande paciência para mim... (...)
Nas visitas que seguidamente fizemos aos meus tios, esperava uma altura em que ninguém reparava e escapulia-me até ao quarto dele. Eu tinha só 15 anos mas não tinha medo nem me fazia impressão nenhuma entrar no quarto dele, era a maneira que eu tinha de matar saudades. Ficava lá uns minutos a olhar para o seu pequeno mundo, o mundo que o António cá deixou. Estranhamente aqueles minutos faziam-me bem, era uma maneira de estar com ele.
Os anos passaram...
... e hoje eu lembrei-me do meu primo. Acho que foi um tempo bem empregue o que passei a escrever sobre ele, ainda que tenha ficado muito por escrever...

Só posso concluir que a prole não é o único legado que se deixa aqui...
destino de hoje: São Julião - Ericeira




sábado, 6 de setembro de 2008

Óculos escuros


Fui ao cinema. Lá em baixo, mesmo na primeira fila, estava uma maluca a olhar para o écran de óculos escuros postos em cima do narizinho, como se andasse na rua a passear ao sol...
Aquilo seria porquê!?
"Nunca me preocupei com o anonimato" acabei eu de responder a alguém. É verdade, nunca me preocupei mesmo. Com o meu e até com o dos meus filhos. Nunca escrevi, se queria escrever o seu nome, apenas a inicial. Acho que não terá mal algum, qualquer um deles tem nomes vulgaríssimos. Que mal é que tem? Se houver está noutra cabeça que não na minha, certamente.
Não tenho o mínimo jeito para entrar aqui disfarçada do que quer que seja. Revelo o que acho que tenho que revelar e conto o que acho que tenho para contar, tendo por gosto registar acontecimentos.
Sempre soube que há o publicável e o impublicável. O impublicável é isso mesmo, não quero publicar porque acho que não devo e não devo porque sei que não quero.
Mesmo o publicável, mesmo esse, fica sempre cá dentro alguma coisa, porque me estabiliza. Porque acredito que se assim fizer vou controlar qualquer coisa que eu sei que existe, porque a sinto todos os dias da minha vida. Não posso dar tudo, alguma coisa tem que ficar comigo.
O interesse em escrever reside também aí - saber dosear, acertar na dose.

Virtualmente

Desde que tenho o blog, pensei muitas vezes se algum dia conheceria alguém pessoalmente. Tenho esse desejo mas não me sinto à vontade para iniciar um contacto pessoal.
Uma dia, a Redonda disse-me que gostaria muito de me conhecer pessoalmente. Fiquei tão lisonjeada quanto perdida com o interesse demonstrado mas como moramos muito longe uma da outra ficou para uma ocasião vindoura.
E entretanto tenho pensado que estas coisas da Internet são sempre muito estranhas e complicadas. Conhecer alguém virtualmente poderá não ser a mesma coisa que pessoalmente, as pessoas que me conhecem somente através dos textos poderão, e certamente estarão a pensar, que eu serei deste ou daquele modo. Já criaram uma imagem, tenho a certeza. Eventualmente, poderei não corresponder à ideia previamente concebida nas suas cabeças, àquilo que vão ver, ouvir e sentir. E eu tenho um defeito que é um dos que mais detesto ter mas tenho-o e julgo nunca me vir a desfazer dele, acho-me sempre aquém de tudo e de todos. E, a somar a isso, acho muito fácil manter uma amizade virtual. Se eu ficar aqui, aconchegada no quentinho que a possibilidade de expressar e publicar ideias e factos sem ser vista oferece, é muito fácil conviver e confraternizar. É muito fácil entrar no blog deste ou daquela e opinar e aconselhar. Claro que é, nem sequer tenho que me levantar da cadeira! Aqui todos esperam a minha vez de falar, todos ouvem e direi mesmo que escutam, todos se detêm e analisam o que "digo". Aqui é muito fácil. Se alguém chegou até aqui e se detém é porque está mesmo interessado, creio. Ao contrário? Não voltará, óbvio! Na presença é outra história.

Tu que lês e não me conheces, como achas que sou realmente?
Antóino!

A panela de pressão começara a dar sinal de fervura. A boneca moveu-se na válvula e logo de seguida pôs-se a rodopiar simulando uma dança que terminaria assim que os alimentos estivessem cozidos. Toda a minha vida ouvi a minha mãe chamar boneca ao apito da panela de pressão. Assim que começa a dança significa que começa a fervura e é necessário fazer-se a contagem do tempo da mesma.
A terceira (!!!) cozinha da minha mãe ainda não tem relógio nenhum na parede...

- Antóino! - chama a mãe da cozinha.
- Que é? - grita o pai que estava no quintal.
- Diz-me lá aí as horas.
- Faltam cinco para as seis.
Silêncio. Ouve-se a panela de pressão com a boneca a girar. O pai continua por ali, vai arrumando umas coisas... A mãe abre a janela da cozinha que dá para o quintal:
- Antóino!
- Hum...?
- Já não me lembro que horas eram...
O pai flecte o braço esquerdo e olha de novo para o relógio para transmitir as horas certas.
- Eram cinco para a seis, agora são quase seis, faltam dois minutos.
De novo o silêncio alentejano, quieto e sossegado pela ausência de muitas coisas e, evitando-me uma sensação de entontecimento pela inexistência de ruído, ouve-se lá dentro da cozinha a panela fervendo e a boneca dançando.
O pai já arrumou os garrafões de água que trouxe do Poço das Fontaínhas e trata agora de preparar a bicicleta para a guardar na pequena garagem. Entretanto todos participamos numa amena cavaqueira.
A mãe assoma à janela. Silenciamo-nos todos e todos olhamos para ela.
- Antóino! Já não me lembro que horas eram... - nota-se-lhe um muito ligeiro desconsolo na voz.
A Ana Cláudia solícita responde em vez do avô:
- Avó, eram cinco para as seis...
- São agora seis e dois minutos - conclui o pai, que tem uma cisma muito peculiar com horas certas.
Volta a ocupar-se dos seus afazeres, não pára quieto um só instante. Todos vamos conversando e rindo, contando peripécias das férias. O pai escuta e manda umas larachas aqui e ali. Quando, pela quarta vez, aparece uma figura familiar à janela da cozinha:
- Antóino!

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Dezassete anos!!!


Título:
Ana Cláudia

Apresentação:
Este ano o aniversário dos ricos filhos é registado relatando a história que gira à volta do nome que escolhi(emos) para eles. A rica filha hoje faz dezassete anos, está na hora de contar a história do nome dela.

História:
Desde miúda que adoro o nome Ana, é um nome vulgar mas muito simples. Se eu pudesse escolher o meu próprio nome chamar-me-ia Ana.
Tem um particularidade engraçada - fica bem a acompanhar quase todos so nomes - Ana Maria, Ana Catarina, Ana Raquel, Ana Margarida, Ana Carolina, Ana Sofia... Ana Sofia era o que eu mais gostava!
Nos anos oitenta, ainda antes de sequer pensar em casar (casei em 1989 e sim... eu sei que para fazer bebés não é necessário estar-se casado/a mas os meus bebés são ambos posteriores a 1989), foi para o ar uma telenovela, da qual não recordo o nome mas também não interessa para o efeito, em que a personagem principal se chamava Ana Cláudia. Nunca tinha ouvido estes dois nomes juntos e fiquei logo apaixonada... nunca mais esqueci e lembro-me de pensar que se um dia tivesse uma filha ela se chamaria Ana Cláudia.
Porque entretanto, e isto uns anos antes, tinha nascido uma sobrinha minha, da qual fui madrinha, e eu tinha dado a ideia ao meu irmão e à minha cunhada de porem à menina o nome Ana Sofia e eles tinham aceitado a sugestão...
A cinco de Setembro de mil novecentos e noventa e um à uma hora madrugada sensivelmente, segundo diz o pai que olhou para o relógio que se encontrava na sala de partos eram uma hora e quatro minutos e segundo digo eu, que olhei para o relógio que trazia no pulso, era meia noite e cinquenta e oito minutos (a hora em que publico este post), a menina nasceu. Quieta, lívida e calada devido ao longo trabalho de parto mas lá dentro depois dos primeiros e essenciais cuidados médicos logo a sua vozinha se fez ouvir. Nunca mais se calou, digamos...

Notas:

- Eu chamo sempre Ana Cláudia à Ana Cláudia. Nunca só Ana ou só Cláudia. O pai idem, o André chama mana até hoje, os restantes familiares chamam como eu. Os amigos na maioria chamam-lhe Lala e o amigo especial chama-lhe Ana Cláudia, como eu...

- Gosta do nome que tem e eu fico feliz por ter escolhido bem. Em pequena e quando começou a falar dizia chamar-se Cadaca e mais tarde Ana Cádlia.

- Sendo a primeira da minha prole se tivesse nascido menino chamava-se...
André Luís! Possivelmente esta história sairia diferente.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Perguntas

Ontem à noite, antes de deitar:
- Mãe, a que horas é que rebentaram as águas?
- Mais ou menos às oito da manhã do dia quatro e tu nasceste à uma da manhã do dia cinco - respondi.
- Tanto tempo...!
- Pois foi. Mas não estive esse tempo todo com dores... - eu sabia que era ali que ela queria chegar.
Hoje de manhã, por volta das oito:
- Mãe, a esta hora as águas já tinham rebentado?
- Sim, por esta hora já.
À tarde, rondando as duas horas:
- Mãe, a esta hora já estavas com dores?
- Hum... sim, qualquer coisa... mas ia piorar.
A rica filha vai nascer daqui a pouco...

Que coisa estranha...

Enquanto o Luís dava instruções ao empregado do restaurante para marcar um jantar para umas dez pessoas, o homem apontava tudo no guardanapo que assentava em cima da mão - e não desajeitadamente, diga-se - em... japonês!
Estou de férias e não tenho histórias. Há quase duas semanas que não vendo, que não faço registos e trocos, que não penso:

"adeus boa tarde e vai para o raio que te parta!"
ou
"ai... onde é que eu vou arranjar paciência para aturar este gajo...?"

que não ouço dizer:

"quê!? tão caro!?"
ou
"olhe... tem cá coisos de 'cetona?"
ou
"compro sempre tudo aqui mas já há muito tempo que aqui não vinha"
ou
"queria corda para assim tipo pendurar a roupa"

que não respondo coisas do género:

"pode falar comigo acerca dquilo que quiser... desembuche que eu logo lhe digo se pode continuar ou não"
ou
"um quilinho é um quilo pequenino portanto é menos de um quilo, não é?"
ou
"se eu soubesse fazer dinheiro não estava aqui a olhar para si".
ou
"ah... lamento mas só vai conseguir ver-me a mim..."

Em suma, por muito que me custe (e custa!) a minha profissão dá-me uma visão muito peculiar, direi até extensa porque, em parte por causa do blog, habituei-me a observar as pessoas pelo contacto directo, julgando e opinando mas não condenando e parece-me que consigo ter uma certa distância o que me permite ser totalmente imparcial naquilo que escrevo. Observo, concluo e emito as opiniões aqui. Só isso.
O meu blog é um reflexo do que observo durante o dia no horário de expediente ou no grande intervalo de almoço. Se não tivesse esta profissão eu não teria tantas histórias para contar, o meu blog não seria escrito da maneira que é.
Não estou triste por não estar no local de trabalho, nem estou com saudades de lá estar. Estou triste por que queria ter histórias e não as vou ter se não sair de casa...

O futebol do rico filho



Ele sabe o que quer...

(clica na imagem para ver melhor)

Cusquices no masculino - também as há, sim sim...! oh...! sim!!!

O amigo emigrante chegou de férias e entre eles puseram-se logo as conversas em dia. Ninguém me contou, fui eu que ouvi:

- Eia nem sabes... sabes aquela assim assim... já foi para ali...

- Ah... a tua amiga agora já faz daquilo...

- Bem... houve um dia que se saiu com uma... nem queiras saber...

- Olha pá... se tivesses visto como ela vinha vestida... ui...

- Xi... a amiga daquela teve montes de saudades tuas...

- Eh... fazes cá falta, pá!

Falaram das gajas todas e quês, das boas, das muito boas, das más, das muito más, das assim-assim, das muito assim-assim e blás. E eu pergunto-me - se fossem cusquices no feminino, o que é que elas eram? Isso mesmo!

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

FEEDJIT

Há uns meses decidi colocar ali do lado direito desta minha página virtual, o Feedjit.
Não sei explicar em pormenor como funciona mas sei que é um site que me permite saber de onde "vem" quem acede a esta página directa ou indirectamente.
Tive sempre curiosidade em saber se alguém leria este blog sem se "mostrar" e foi esse o principal motivo que me levou a colocar o Feedjit.
Cedo percebi que aquilo não me iria fornecer informações muito precisas ou sequer fiáveis, mas fui deixando ficar e fui observando.
Neste pouco espaço de tempo já tirei algumas conclusões, algumas são engraçadas.
Vejamos:

Optei por um blog totalmente público, em qualquer busca Google ele poderá aparecer, até aí já eu sabia. Mas nunca pensei vir a descobrir que as frases postas no motor de busca Google em que o meu blog mais vezes apareceu até hoje foi "texto em francês" e "frases sábias".
Curiosa ou ironicamente, nenhum destes post's são exclusivamente da minha autoria. Mais... je ne donne pas d' importance, c' est vrai...
Mas há mais - descobri que o meu blog aparece (embora não na primeira página como os dois exemplos acima) se no motor de busca se puserem frases como estas:
  • sou uma puta
  • pila de homem
  • deixei a mão por cima da cona da minha sogra e acho que ela gostou
  • mamas e vaginas

Qualquer dia ainda aparecem aí os senhores da moderação destas coisas e acabam-me com o blog alegando vocabulário impróprio ao bom desenvolvimento socio-cultural e isso...

Andar na via pública com uma t-shirt onde se lê em letras garrafais: "I' m single" significa que quem a usa quer alterar o estado civil ou está ansiosa por qualquer coisita?

Por causa da renovação do Bilhete de Identidade...

... descobriu-se que desde o dia trinta de Abril de dois mil e três até ao dia dois de Setembro de dois mil e oito... o rico filho cresceu trinta e quatro centímetros...

Agora sei

Moveu-me a curiosidade, o teste. Queria saber se tinha havido mudança, por ínfima que fosse bem vinda seria.
Fiz o que queria, houve partes custosas mas gostei do final.
É assim que vivo - procuro... quando quero saber.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Agora a minha vida passa em câmara lenta. Vivo submersa em lentidão, indolência. Demoro nos afazeres e nos pensares com prazer. Divirto-me. É bom.
Vou deixar-me aqui ficar enquanto puder... enquanto conseguir... enquanto isto durar... enquanto me deixarem.
Alguém me chamará à razão. Esse alguém não sou eu, é outro alguém que não quero ser.

Pelo que se vê, tenho andado entretida...








Esta maluca que tem as mãos a cheirar a lixívia por ter acabado de desencascar duas das divisões desta casa e que anda aqui a publicar coisas na Internet... mas devia era estar a lavar os vidros e os caixilhos das janelas de todas as divisões desta casa... mas não está, está aqui agora para comunicar que o ponto alto deste dia, até agora, foi ter visto ali para os lados dos Olivais, um senhor com três cigarros acesos na boca ao mesmo tempo... será para morrer mais depressa?

nas férias, vi de passagem...

... a empregada da pizzaria... é tão comprida e tão larga que para nos pôr os pratos à frente tem grande dificuldade e não meter as mamas em cima da minha cara... olha se fosse na cara do Luís...? ai tão bom...

... a espanhola... aparece na piscina às onze da manhã e sai de lá quando é quase noite e neste espaço de tempo saltita entre uma entrada na água para - apenas e só - molhar o corpinho esturricado do sol e o descanso debaixo desse mesmo sol abrasador para secar o corpo que - apenas e só - molhou na água da piscina... há pessoas muito ocupadas, que eu nunca disso duvide...

... a caixeira do supermercado... a quarta vez em que me viu no mesmo dia pagar a conta com miúdos de modo a não ter que devolver troco, certamente terá pensado: "porra! este caraças desta portuguesa não terá nada mais interessante para fazer que juntar moedas e vir para aqui obrigar-me a contar dinheiro e mais o raio que a parta?!" isto, tê-lo-á pensado em castelhano, pois claro...

... o vendedor de semanas de férias lá do sítio... que apesar da pouca idade tem um olhar tão cheio de astúcia que parece uma raposa velha rondando qualquer presa que se lhe apresente... é-lhe indiferente se a presa tem chicha (leia-se dinheiro) ou nem por isso...

... o casalinho namoriscando enroscados entre si... são ambos de uma beleza perfeita, diria inexistente se não a tivesse visto com os meus próprios olhos, parecem talhados à mão tal a perfeição das feições e dos corpos... pois é... é a Niki Beach, amigos!... aquela praia está cheia de gente tão perfeita aos olhos da mortal imperfeita (eu) que deveria existir uma prateleira especial para expor estes modelos de perfeição tão perfeitamente perfeita... não deveriam andar por aí para não se estragarem...

... a turista alemã... vira-se na cadeira de piscina e ouve-se um clik! - acabou de partir aquela merda mas continua escarrapachada lá em cima, ela e mais o metro e oitenta de alura e os vinte quilos de banha que tem à volta da cintura, como se nada fosse... na verdade aquilo não é nada, então e a gente paga para quê...? ó meus amigos, relax...!

... e depois há a gaja boa... pelo menos assim sentadinha em cima da toalha como está parece boa... sozinha na praia... hum... tem a pele sem pingos de água e o cabelo seco e brilhante, sinal de que não está ali para "ir à praia" está só para "ver" a praia... hum... e fuma... tem uma tosse que mais parece uma meia dúzia de gatos ronronando em uníssono... deita as cinzas directamente na areia... hum hum... porca!

Este é o Alentejo que conheço:






segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Responsabilidade

- É tão bom dizermos que ninguém gosta de nós... a sério, não sei porquê mas sabe mesmo bem dizer "ninguém gosta de mim" - disse a rica filha.
Eu, que até sei porquê, expliquei-lhe*:

Se ninguém gostasse realmente de nós, ficaríamos livres de fazer as coisas que estão bem para os outros, digamos que nos tirava uma carga das que mais pesa de cima dos nosso ombros. Porque, alguém gostar de nós, quer por laços familiares (de sangue ou não), quer por laços de amizade, obriga-nos a pensar antes de agir ou de falar para não ferir susceptibilidades e isso faz-nos sentir uma responsabilidade que de outra maneira não teríamos. É por isso que, às vezes, saberia tão bem que ninguém gostasse de nós pois esse desejo dá-nos a ilusão de que ficaríamos leves e livres, sem ninguém para nos obrigar a fazer isto ou aquilo, o que até nos faz pensar que vivemos num mundo de hipocrisia...
Desengana-te, miúda... temos mesmo que viver num mundo hipócrita e em que tudo é vão e vaidade... mas há sempre quem goste de nós e ainda bem, pois a solidão é do piorzinho que há neste mundo para sentir...

*na altura expliquei-lhe em linha gerais o que agora, escrevendo, desenvolvi um pouco mais

Por trás de um qualquer balcão de pastelaria, alguém teria pensado assim:

Uma figura pequena recortou a luz que entrava pela porta aberta. Vestia um top vermelho e uma saia branca com muita roda. Tinha um ar triste e abatido, os olhos estavam húmidos e forçosamente apagados como se quisessem dissimular qualquer coisa.
Pediu-me um café e esperou em pé que a servisse. Achei estranho uma mulher aqui sozinha, ainda para mais com um ar tão solitário quanto distante daqui.
Pus-lhe o café à frente, ela agradeceu e levou-o para uma das mesas. Sentou-se cruzando as pernas, apoiou os cotovelos na mesa e o queixo numa das mãos sem tocar no café. O olhar continuava o mesmo - húmido, dissimulado e distante mas atento. Simultaneamente conseguia focar o olhar em ponto nenhum e prestar atenção ao local.
Não sei quanto tempo passou... agarrou na chávena e deu um pequeno gole. Reparei que não pusera açúcar no café - quereria manter a linha? Possivelmente. As mulheres têm destas coisas... Foi bebericando o café aos poucos, saboreando com prazer cada golinho do café amargo.
Entretanto chegou um cliente e eu deixei de ter tempo para continuar a observá-la discretamente. Mas, assim que pude, lá continuei observando.
Com o passar do tempo, o seu semblante adquiriu determinação sem no entanto deixar de parecer distante.
Quando achou que chegara a hora, agarrou na moeda de um euro que, desde que ela se sentara, tinha passado todo este tempo em cima da mesa à espera de ser precisa e perguntou-me:
- Quanto lhe devo?
- Sessenta cêntimos.
Estendeu-me a tal moeda, dei-lhe o troco e ela saiu com duas moedas de vinte cêntimos na mão. Nem carteira trazia consigo...
Saíu tão misteriosamente como entrara. De onde viria? Quem seria? Porque andaria só e triste?
Mesmo numa pacata aldeia como esta acontecem coisas que dão que pensar...